quarta-feira, 6 de julho de 2016

HÁ SEMPRE OS QUE ESTÃO A MAIS



PROVOCAÇÕES FILOSÓFICAS

A FELICIDADE


Falar de felicidade no dia de hoje, num Portugal em cíclica crise, numa União Europeia de duvidosa democraticidade, em que se não conhece quem manda, nem se sabe o que fazem os que são eleitos, e com um Parlamento onde se não muda uma vírgula numa única lei, e ainda por cima empurrados para a Serra de S. Mamede onde está numa das encostas sediada a cidadela de Portalegre, é assunto assaz brutal, diria mesmo, é fazer patinar uma doze imensa de energia no vácuo, é fazer chover no molhado, é procurar acrobaticamente definir algo que por si já não é fácil, menos tendo por pano de fundo toda esta cadeia de tristezas. Pode haver felicidade por aqui? No meio das mágoas, das melancolias, do cante, da quietude, da espera?


A felicidade que já foi um conceito cósmico, e foi mudando com o tempo e com os homens que sobre estas coisas pensaram, não é mais que um instante feliz, um instante de tal modo feliz que o homem o quer prolongar eternamente. Esse instante prolongado no tempo, esticado, onde se encontra perpetuada a alegria determinaria a felicidade do homem. 


A felicidade que também já foi um conceito humanista, é uma variável que variando vai entorpecendo o pensador que chega ao desnorte de pretender encontrar uma definição ou conceito para a suprema vontade que o homem conhece, a dádiva da felicidade, o acto supremo de ser feliz.


Alguns, pragmáticos, dizem que são felizes, e estão categoricamente certos de possuir esse dom, baseando a justificação na vida vivida, em factos, em terem conhecido momentos de angustia, tempos de incerteza, períodos de melancolia, pelo que comparativamente podem assegurar serem felizes, pois já conheceram a tristeza e o que sentem e o que vivem está a anos luz desses tempos negativos e tristes que já vivenciaram.


Outros, cépticos, entendem que a felicidade é uma ideia apenas, algo que o homem persegue desde que nasce até à morte sem nunca encontrar plenamente. A felicidade é como que uma meta que sendo alcançada deixa de ser desejada e logo se evidencia uma nova meta, essa sim, capaz de garantir a felicidade. E o homem empenha-se, esforça-se, estafa-se, corre, trabalha, luta e leva anos e mais anos até que atinge a tal meta que o faria feliz. Só que obtida percebe que apenas ultrapassou uma miragem pois a meta , a que verdadeiramente pode o levar a ser feliz ainda está na sua frente, como cenoura, e ele corre e come a cenoura, e volta a correr, e a comer cenouras. Até que ao chegar aos noventa e tantos, rodeado da família, todos envoltos em tristeza, um comenta aos demais que não há motivo para choros nem mágoas, agora é que o nosso ente querido vai entrar na vida verdadeiramente feliz. É a felicidade prometida.


Depois aparecem os que baralham toda a trajectória filosófica e dizem que a felicidade tem hora e sobe  e desce. Uns são verdadeiramente felizes ao acordar e cantam, tomam banho a cantar, e saem ao trabalho olhando sorridentes o mundo que os envolve. Outros só conseguem ser verdadeiramente felizes quando os outros se deitam e eles sós, produzem os seus trabalhos, as suas obras, no silêncio da noite, na calmaria e na solidão. Outros parodiando, se se permite este tipo de metodologia nada cientifica, encontram a maior das felicidades quando comem uma bola de Berlim, a felicidade é a Bola de Berlim, é doce, tem açúcar, é cremosa e estavam a morrer de fome, Tão felizes se encontram com a bola que comem outra, mas a segunda bola já não parece ter a excelência da primeira, e arriscam mais uma, sempre é feliz ter bolas de Berlim, mas quando o felizardo chega à sétima bola de Berlim, ele sente que não pode mais, não sente doce, não sente o açúcar, não dá pelo creme, e se continua morre. É o caso em que a felicidade leva à desgraça.


Depois há no mundo os que têm uma visão depreciativa de tudo o que é ligado ao ser ou ter feliz ou felicidade. Incomoda-os a felicidade alheia. Mais radicais que os cépticos rejeitam qualquer ideia de felicidade e consideram que o homem veio a este vale de lágrimas não para ser feliz ou para alcançar alguma felicidade, mas para sofrer, para penar, para carpir desgraças e misérias. Obviamente não são felizes, não acreditam na felicidade, nem admitem a hipótese de sê-lo alguma vez. E nesta classe de eruditos existem os activos e os passivos. Os passivos como sua denominação indica não agem, limitam-se a deixar passar o tempo, e este mais não é que um ritual que se prolonga por tempo determinado mas desconhecido. A vida passa por eles e eles não passam pela vida, estiveram por aí. Já os activos radicais que rejeitam a felicidade, não a reconhecem nem como ideia nem como modo de estar, e muito menos como promessa. Ao contrário dos passivos a vida passa mas eles vão com ela, semeando tudo o que possa ser entrave à felicidade alheia. São as pessoas mais perigosas, considerando-se mais sábias que as outras, e detentoras de uma razão própria, atacam de qualquer modo o seu semelhante, a sua função humana é provocar o mal, fazer danos, ultrapassar regras, pisar, enganar, prejudicar os outros. 


Estes seres são a verdadeira provocação, não filosófica, mas ao ser humano, à vida, ao mundo e com todas as energias à felicidade dos outros. Paradigmaticamente são os únicos seres a quem é vedada a verdadeira felicidade. Qualquer tipo de felicidade. De qualquer ideia ou conceito. São seres de pobreza espiritual marcante, debilidade de sentimentos, sem valores nem sentido ético.  Não conhecem a felicidade, não lhe têm qualquer acesso, e não a merecem. São pouco mais que lixo, fedem bestialmente, e pouco mais são que corpos putrefactos ambulantes. E existem, andam por aí. Cuidando de atropelar os outros. São anjos demoníacos. A filosofia nunca os questionou. Não os conhece. Não quer nada com essa gentalha. 





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