quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Viva a corrupção…

Viva a corrupção…

Medina Carreira dizia ontem num programa televisivo que não conhecia em Portugal gente importante na cadeia, ou a caminho dela, por prática de crime de corrupção. Dizia aquele economista que juntando duas ou três pessoas entendidas nestas matérias de justiça, sugerindo mesmo um magistrado que conhecia, facilmente se encontraria maneira de pôr cobro a essa chaga que atormenta o país. Deu também o exemplo do que aconteceu ao antigo ministro socialista João Cravinho, afastado para um eldorado no outro lado da Europa, para manter bem longe, da vista e do coração, as propostas que aquela individualidade apresentou para se acabar, imaginem só, com a corrupção em Portugal. O conjunto de medidas apresentadas arrepiou meio mundo, e tomou de pânico a classe política.
Cada vez é mais claro que os políticos não só se mexem bem entre os meandros da mais esmerada corrupção, como precisam dela, como de ar para respirar, tudo fazendo para mantê-la bem viva e actuante.
De tal modo a corrupção é um elixir milagroso para um punhado de gente instalada nos comandos do país, que em matéria que seguramente garantiria um punhado expressivo de votos, dada a repulsa que cada vez maior se sente entre as gentes e a promiscuidade existente entre a classe política e todo um elenco de atitudes e comportamentos adoptados entre os políticos com visíveis frutos, em tempo de campanha eleitoral ninguém fala em compadrios e corrupções, em troca de favores, em tráfico de influências, ninguém ousa tocar em assunto tão sensível, que faz claro dando ao país, minando as suas forças, diminuindo a sua capacidade de prosseguir.
O país está mal, mas é evidente que entre a legião de políticos, entre os militantes dos partidos com responsabilidades governativas e de maior representatividade, reina uma desleixo, um deixa andar, que bem comprova que anda todo um povo a reboque da falta de ética e de princípios de meia dúzia de oportunistas que vivem do tacho e de expedientes fáceis. Parece mesmo que a muitos que não conseguem vingar no meio dos imorais expedientes instalados, não choca o que acontece, o que se faz, a rotina, entristece é a inabilidade, ou a falta de conhecimentos, para fazer como os demais, e enriquecer facilmente. Não se condena o crime, apenas se fica triste da incapacidade de o cometer e, desse modo, garantir um favorecimento.
Só existe corrupção em Portugal porque os sucessivos governos, e toda essa gentalha que come do orçamento, engordam felizes no sistema. E o povo, coitado, bem, entre a espera de um favor do vizinho que subiu na vida e dirige uma repartição, ou do primo que sem saber ler nem escrever é secretário de um governador, ou do amante que garante mais um contrato na administração do estado, o povo, bem coitado, continua a votar, sem esperança, mas mantendo o regabofe, bem trágico de um país cansado, imoral, injusto e feudal. Porque meia dúzia de corruptos assaltaram o poder e vivem disso. Felizes. Prósperos.
O povo, continua a votar, a cumprimentar quem lhe estende a mão, nas alegrias farsantes das campanhas eleitorais de rua, a fingir, a sorrir, quem sabe se um dia não vamos precisar do doutor, ou do deputado, ou do filho de A ou de B. Mais vale sorrir, curvar a cabeça, dizer que sim, ou mesmo um aplauso, – cá por dentro fazemos um manguito – quem sabe se com essa simpatia, não se garante amanhã, um pequeno favor.
Afinal tudo isto á bem pouco, e em velocidade imensa para minguar, bem melhor é fazer que sim, que se é, deste, e de aqui a pouco se necessário do outro, e de toda a agente. O que é preciso é entrar no carrossel, e viajar com música, subindo sempre, preferivelmente, cómodo e tranquilo. Viva a corrupção.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Não vou votar...



Ouvi mais ou menos com atenção os debates dos líderes dos principais partidos políticos portugueses, por este tempo de começo de campanha eleitoral para as legislativas portuguesas.
Dificilmente equacionarei a hipótese de sair de casa a votar. É, uma perca de tempo. E uma maçada.
Teria de convencer-me da utilidade de participar no acto eleitoral para o fazer e, pelas razões que passo a expor, estou convencido da inutilidade total. Senão vejamos;
- No meu círculo eleitoral são eleitos dois deputados, e não havendo, como previsível, uma revolução sem precedentes e inimaginável, será uma divisão, um para cada lado, entre os dois partidos maiores. O PS e o PSD, a fome e a vontade de comer, os que nos prometem o mesmo de sempre, pouco e mau, não fora a conversa fiada. Os que enganam e os que enganaram, os que estão hoje e os que estiveram ontem.
- Qualquer voto que pudesse colocar na urna, em sentido de um qualquer outro partido, morre aí, num número sem qualquer valor, a não ser, eventualmente, num número final de votantes naquele partido ou movimento e numa percentagem perdida entre milhentas que naquele dia andam nas bocas do mundo.
Não servindo de nada o meu voto, por não ser colocado num dos dois partidos vencedores antecipados, não vejo qualquer serventia, ao acto masoquista de intervir numa rotineira acção que, escudando-se na responsabilização dos cidadãos em participar nas decisões que poderão afectar a governação do país, não atribui ao meu voto qualquer valor, remetendo-o, e tão só, para um género de listagem estatística, tipo resultado de uma qualquer partida desportiva, ou concurso televisivo.
Sendo que os dois maiores partidos são os quase únicos responsáveis pela tragédia lusa, não esquecendo de meter no saco a legião de cabecitas pensadoras que os têm elegido – não se deve esquecer que cada povo tem o governo que merece, no caso que escolhe – e, que os outros grupos de ideias organizadas politicamente, não convencem de modo a ser alternativa, muito menos no meu círculo eleitoral, onde concorrerem ou não, é só questão de estar presente, efectivamente não colhe aqui qualquer dever de escolha, porque simplesmente ela não existe.
Creio que a criação de um círculo nacional já remeteria para o mesmo saco todos os votos de todos os círculos, tornando úteis as decisões subscritas através da cruzinha, e dando, deste modo, uma resposta concreta, objectiva, mais real, a todos os votos colocados em qualquer lugar. Mesmo daqueles lugares, onde o número de pessoas, com o método tradicional, por ser tão pouco expressivo, se encontra enfermo da submissão, da tirania, de um ou outro, esquecendo os demais. Deste modo, poderia, pensar-se numa mais efectiva proporcionalidade que afinal mais não é que o respeito rigoroso pelas opiniões do universo de cidadãos.
Ouvi, sem grande ânimo os debates e mais debates. Quem mal fez não consegue fazer um “mea culpa”, não tem a humildade para dizer que errou e que deve emendar-se o erro, dando a mão à palmatória, e o que nada fez, com ar de uma inocência que já não convence ninguém – ainda há pouco tempo fazia igual ou pior daquela que está na governação – esgrime argumentos deitando abaixo o seu opositor, e tentando convencer o Zé povinho, que teria feito mundos e fundos, e tudo andaria bem, se por ali estivesse.
É um desconsolo ouvir esta gente. Nada fizeram de mal e o país caminha para uma santa desgraça sem qualquer hipótese de mudar de caminho, mas vão fazer bem, sem limites e sem fim, se o povo – que tudo sabe agora – reconhecer a sua mensagem e o premiar com a sua escolha.
Vamos continuar nesta tragédia, bendita, perpétua, vitalícia, de enterrar o futuro, de desmoralizar quem tem vontade de fazer alguma coisa, de nos mantermos apenas à tona da água, ao sabor das correntes, sem rumo, à espera de um qualquer milagre que nos levante o olhar quando caminhamos pelas ruas, que nos faça sorrir ao olhar o nosso vizinho pela manhã, que nos leve a crer que estamos num mundo de elite, por direito próprio e por tudo o que fazemos.
Daqui a uns anos, possivelmente bem poucos, voltaremos a ouvir mais debates, e a votar, e a caminhar, à deriva, como de costume, sem energias e sem esperança.
Votar, nestas condições parece-me, mais que um aceitar do pandemónio, um desistir, acomodando-se a um existir sem qualquer vida. Sem alegria. Sem horizontes. Votar, parece um dizer que sim, quando toda a nossa alma vai perdendo entusiasmo, e o nosso corpo recusa esforço, por ter deixado de acreditar.
Não votar, parece-me, é estar ali, nos que não pactuam com a farsa, não aceitam o caminho que tudo levou, que desejam participar, sem dúvida, quando o jogo tiver contornos sérios, e não de batota, como hoje sucede.
Por tudo isso, vou manter-me, atento, mas não sairei de casa a votar. E, pelo menos tenho sentido uma coisa, em bom rigor, desde que deixei de votar, mais nenhum partido político me decepcionou, nem mais nenhum político me enganou. É isso, já não me enganam ,não voto. Enquanto sentir essa vontade. E a bem da minha consciência.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Que anjo...


A política é uma comédia sem paralelo. Ontem, depois do jantar, sentei-me tranquilo a ver a entrevista à RTP1 do primeiro-ministro de Portugal. Ar inocente, angelical mesmo, o senhor Sócrates tentou com voz serena, sem sobressaltos, explicar que ousou fazer tudo, o possível e o impossível, para melhorar Portugal, que, na sua opinião, não tem nada a ver com o país que encontrou quando há quatro anos começou na governação. Melhorou o país, muito se fez, e confia que os portugueses não deixarão de reconhecer tudo o que se tem feito. Mesmo em relação à crise, que em todo o mundo criou amargos de boca em empresas e nos povos, não deixou de salientar que, ao contrário do que muitos velhos do Restelo apregoavam, encontrou o seu fim no nosso país muito à frente de outras economias que ainda sentem aqueles nefastos efeitos. Aceitou que teve momentos de firmeza, que alguns confundem, sem que se justifique, com teimosia, e eventualmente terá sido incompreendido por alguns corpos profissionais, como ocorreu com os professores.

Mas promete, o senhor Sócrates promete, depois de quatro anos em que não deu quaisquer ouvidos a uma classe profissional que levou dias e dias protestando com todos os meios legítimos e possíveis de que dispunham, promete agora, que se ganhar as próximas eleições tudo vai fazer para voltar a conquistar a confiança daqueles profissionais.

Que anjo…

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Com crise e sem qualquer classe




Falta de classe

O engenheiro Sócrates perdeu a oportunidade de ser legitimamente considerado o melhor governante de Portugal depois do 25 de Abril de 1974. Poderia ter sido o primeiro ministro mais marcante positivamente falando do Portugal democrático. Teve coragem, trabalhou, fez, defrontou-se com as anquilosadas forças que sempre se revelam contra qualquer intenção simples de reformar, enfrentou a maior crise que fustigou o mundo nos últimos anos, mexeu e remexeu em muito que necessitava ser ser mexido, fez muito mais que qualquer outro antes dele, enfrentou importantes grupos e corporações, goste-se ou não dele, tem que se reconhecer que iniciou um caminho, não desistiu, fez obra. Todavia, corre o risco, será uma ironia da nossa história actual, de sair pela porta dos fundos, e de perder uma eleição para a governação do país, a favor de uma candidata a primeira ministra que em condições normais nunca governaria Portugal, por possuir uma imagem pública demasiado pesada e de outros tempos, e por passado em governos anteriores onde deixou marcas de pouca flexibilidade e sensibilidade, apresentando uma imagem de muita dureza e teimosia.

A culpa é toda dele. Sócrates foi longe de mais. Foi prepotente no trato, desafiou desabridamente demasiada gente. Foi inflexível e penalizou sem a menor sensibilidade uma quantidade de pessoas. Foi mais longe o engenheiro socialista, e enquanto arrogantemente defendia as suas políticas, não sem um sorriso hipócrita de quem tudo sabe e a quem todos têm de se submeter, ao mesmo tempo, apregoava trucidar gente, não desviar um milímetro do seu caminho, doesse a quem doer, tivesse ou não razão.

Estragou, como um menino de birras impaciente e mal educado, toda uma labuta que lhe chegou a granjear elogios das mais variadas instancias, nacionais e estrangeiras, ao levar, efectivamente, longe de mais, a sua teimosia, a sua inflexibilidade, o seu ataque a quem se lhe tentava opor, a sua arrogância.

Fez um ataque como nunca se tinha visto em Portugal aos funcionários públicos, que praticamente aniquilou por decreto, tendo, unilateralmente, alterado o seu tipo de vínculo com o estado, destruído as suas expectativas de carreiras, aumentado o seu tempo de trabalho para a reforma ao mesmo tempo que se diminuía o seu montante, isto, sem respeitar os direitos que muitos detinham por uma vida ao serviço da coisa pública e que de um momento para o outro se acharam, com o futuro virado do avesso, sem expectativas, e desrespeitados. Não ocultou a vontade de despedir a todo o custo, ignorando que seria mais sério deixar sair quem uma vida dedicou ao trabalho no Estado, que criar mecanismos de duvidosa legalidade para mais tarde lhes pregar um pontapé no traseiro.

Quando apostou na educação, fez o maior ataque e achincalhamento possível à classe dos professores, tornando-os pior que coisa nenhuma, sem qualquer valor, e desclassificados na praça pública. O povo assistiu atónito a professores impedidos de se reformar com cancro na língua, e outros casos semelhantes. Contra tudo e contra todos, desprezando um expressivo descontentamento que se manifestava como nunca se vira, um pouco por todo o lado, o ataque aos professores fez-se de todas as maneiras e sem qualquer respeito. Era malhar até poder; impor sistemas de classificação de serviço de duvidoso efeito e de uma complexidade e burocracia impensável; impor a destruição do sistema de carreiras trocando-o por um outro que não foi aceite por ninguém, foi asfixiar os professores horas e horas nas escolas, envolvidos em tarefas de todo o tipo; foi o confronto, excessivo, arrastado, mais vale partir que torcer, até onde desse.

Tenho para mim que um pouco de bom senso, que um pouco de humildade, que uma dose certa de diálogo, teria apaziguado a revolta nos professores, teria consolidado as reformas no sector, e teria galvanizado toda uma classe para um projecto da maior importância para o país que é ensinar e educar.

Igualmente penso que poderia ter-se evitado a destruição do “funcionário público” impondo-lhe, à força, um novo tipo de contrato unilateralmente e de duvidosa constitucionalidade, e deixando sobre a cabeça de tanta gente, a ameaça de um futuro sem qualquer segurança, e um sistema de progressões praticamente para meia dúzia de afilhados e escolhidos. Destruiu-se todo um sistema, que poderia necessitar de reformas, mas não de ser trucidado, deixando, curiosamente, como antes, os eleitos políticos, a servir sem qualquer exigência prática, fora do sistema que se queria moralizador das classificações, ou seja, do mérito como alavanca de progresso.

Esqueceu-se, por inconfessáveis interesses, a luta contra a corrupção e o compadrio que mina o país. Esquecem-se as legitimas expectativas e justos anseios de muitos jovens portugueses que desejavam ser médicos, num país onde, inexplicavelmente, não produzimos os quadros médicos que necessitamos, e depois de barrarmos o acesso aos nossos jovens vamos recrutar médicos de outros países e outras línguas.

A insegurança nas ruas um pouco por todo o país, e nos campos entre a gente mais idosa nunca foi tanta. A gente grada continua em estado de excepção, ziguezagueando com os tribunais e os códigos de leis, aparecendo nos telejornais, protegidas por nomes sonantes do direito, enquanto a arraia miúda foge da justiça como o diabo foge da cruz a sete pés. Condenam-se os pequenos por dá cá aquela palha, e conhece-se tanto figurão que se passeia feliz enquanto o respeito e a civilização exigiria que estivesse dentro. Os agricultores não têm onde colocar os produtos e empobrecem, ao mesmo tempo que se tem conhecimento público que o ministro da agricultura não aproveitou fundos comunitários que se destinavam ao melhoramento da nossa agricultura.

Fez-se muito, ignorá-lo não parece sério. Mas o que não se fez e que poderia facilmente ter sido feito, e todos os excessos que se utilizaram provocando revoltas injustificadas em muitos milhares de portugueses, acabaram por encher de sombras um governo que poderia brilhar. Teve tudo para isso. Infelizmente, por falta de classe, só nos espera a manutenção na sombra, por muitos anos - já estamos habituados a uma monótona e triste falta de inspiração luminosa - esperando ainda, esse Sebastião, que numa manhã de nevoeiro não deixará de vir governar este povo órfão. Tardará ainda esse dia, e até lá, muitas sombras, como estas por que passámos, não deixarão de tirar sorrisos aos portugueses. Nem de lhes dificultar o futuro.

Que país… onde, ou não se faz, ou quando se faz, melhor se nada se tivesse feito. Onde se perpétua a falta de classe, a falta de cultura e de educação, e onde, a arrogância, a prepotência, a teimosia, ainda são apanágio de muitos sequiosos de se afirmar. De outro modo, já se vê, manter-se-iam ignorados. Que país, que falta de classe.