quinta-feira, 8 de outubro de 2009

A globalização e o homem




A globalização e o homem

Parece interessante encontrar num qualquer supermercado num qualquer ponto do globo um produto há poucos anos inimaginável, ou porque fora de época, ou porque oriundo do outro lado do mundo. Agora, tudo se pode comprar. Democraticamente expostos em lugares de fácil acesso e a preços competitivos, tudo facilmente nos chega às mãos.

Justifica-se esse facilitado acesso a produtos de todos os cantos do mundo com a globalização, esse fenómeno que efectivamente parece ter diminuído o tamanho do mundo, e aproximado coisas e gentes.

Os segredos, as coisas guardadas de cada um, os exclusivos, parecem estar condenados tal a velocidade em que tudo gira, e o modo com que tudo se desloca, parecendo que a magia tomou conta do nosso pequeno planeta, tornando o homem dono, senhor e conhecedor de tudo.

Esperava-se, também, que com essas facilitadas e quase livres circulações de pessoas e bens, de capitais, de conhecimentos e saberes, as colossais diferenças que o mundo sustentava entre os países mais ricos e os mais pobres e afinal, entre as pessoas dos países ditos desenvolvidos e aquelas que nasceram num mundo ainda à procura do desenvolvimento, se viessem a atenuar de modo expressivo. Tornando tudo, um pouco mais igual, o que quer dizer de outro modo, mais justo, e mais humano.

Contra a bondade de milhentas ideias luminosas de homens que dirigem o nosso tempo e as nossas economias, os pobres parecem cada vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos. Consideração que tanto se aplica a gentes como a países. Todos parecemos mais próximos, mas infelizmente, nesses olhares que trocamos é possível perceber mais facilmente a desgraça do nosso vizinho, ou a opulência de um do outro lado, ou deste, ou daquele.

Enquanto o mundo acelerou a vertiginosa velocidade em tudo o que dizia respeito a invasão de coisas e produtos, e movimento de pessoas e capitais, o desenvolvimento, a agressividade produtiva, transformadora e comercial com proteccionismos de uns quantos que se souberam defender com encapotadas medidas, e a incapacidade de outros, reduzidos a meras promessas de evolução, num marasmo sem rumo, determinaram o aumento do desequilíbrio existente entre nações, e afinal, entre os seus naturais.

Deste modo, fracassou um dos mais importantes objectivos que norteavam, ou deviam ter norteado, a globalização, a existência de um mercado de todos, onde se defende, em nome de um progresso concertado e sem donos, vantagens a todos os intervenientes, e com ela, um desenvolvimento e um progresso geral.

Em vez disso, as pequenas nações, cada vez mais endividadas, são abandonadas à sua sorte, sem meios objectivos para encetar a via do desenvolvimento, apenas se tornando parceiras, em processos que se desejavam harmoniosos, mas onde lhes cabe o papel de receber no seu território o que os outros recusam e o de fornecer mão de obra a baixíssimos custos, em locais inadequados, sem quaisquer condições de higiene ou segurança, com ausência de efectivas regras de defesa dos que trabalham, sem direitos nem protecção.

Tudo isto, enquanto as nações mais ricas, continuam a alargar os seus processos produtivos e transformadores aos que lhes servem os interesses, buscando longe custos mais vantajosos, e a permissividade de governos corruptos ou subservientes, aumentando continuadamente as suas influencias, poder, e riqueza.

Se o mundo não deixa de ser, com efeito, um gigantesco mercado sem fronteiras, os homens e os países, continuam separados, condenados a existências desiguais, e a lutas injustas e desproporcionadas para sobreviver.

Pelo que, o processo de globalização existente, não pode servir de bandeira nem orgulhar os diversos actores nela envolvidos, sendo apenas e tão só, uma pequena parte realizada, e onde se denunciam os interesses menos válidos da natureza humana, envoltos em lutas por influencias, dinheiro e poder, esquecendo o homem, e o direito inalienável que lhe assiste a uma existência condigna num mundo que obrigatoriamente terá de ser para todos. Um dia…






sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Que país?... tudo ganha, tudo segue alegre, ...

Paulatinamente decorreram as eleições legislativas neste quimérico reino à beira mar plantado. Tudo para contento de todos, tudo para ver gente simples, feliz, sem lágrimas. Não existem, para nosso contentamento e vaidade, muitos países como o nosso. Viçoso, janota, hilariante, folgazão, e muitos outros adjectivos se poderiam, sem qualquer risco, aplicar.
O partido socialista obteve uma vitória extraordinária, utilizando aqui, nesta definição de sucesso apenas, as palavras sábias, do seu líder em noite de festejos e alegrias.
Em seguida aparece o partido social-democrata que apesar de não ter atingido os objectivos a que se propôs conseguiu ajudar a retirar a maioria absoluta ao partido do engenheiro Sócrates.
Os democratas cristãos venceram mais uma vez as sondagens que o perseguem teimosamente apregoando um desaparecimento a prazo, e coloca-se, para espanto deste mundo e do outro, em terceiro lugar, chegando e ultrapassando mesmo os dois dígitos, numa percentagem de milagrosa explosão.
Os vermelhuscos modernos do bloco de esquerda rejubilaram de gozo e satisfação ao constatarem, sem dúvidas nem erros, que cresceram expressivamente e que, como publicamente se tinham proposto alcançar, retiraram a maioria absoluta aos socialistas.
Os comunistas cresceram, pouco é bem verdade, mas fizeram-no de tal modo, seguro e claro, que o seu secretário geral afirmou que aumentavam mais uma vez a sua influência e implantação, bem como, ajudaram, de modo objectivo, a retirar a maioria existente, que sempre é coisa que resvala em tirania, obtendo, em conformidade uma vitória assinalável.
A abstenção chegou a onde nunca se tinha visto, quase aos quarenta por cento, destacando-se, isolada, no primeiro lugar, e obtendo assim, a maior e mais expressiva vitória das eleições legislativas de 27 Setembro de 2009.
Só é pena não ter tido meio para expressar essa satisfação, entre todos os outros, que felizes ganharam inequivocamente com o sufrágio. E mais pena ainda, não poderem deixar de forma inequívoca, e de modo evidente e prático, à vista de todos, o resultado do seu sucesso, garantindo quase metade dos lugares no hemiciclo de São Bento, vazios, sem dono, entre a outra metade cedida por imprevisível espaço de tempo a alguns sortudos felizardos da nação.
Com os lugares vazios, inequivocamente ganhava o país que deste modo pouparia milhões de contos por legislatura – importante exemplo de respeito pelas famílias e empresas à beira da falência – e a asneira, que poderia ser mais encolhida, na proporção de menos bocas a apregoar fantasias.
Foram umas eleições felizes, em que toda a gente ficou satisfeita, desde os que nem se deram ao incómodo de sair de casa a votar, obtendo da sabedoria de não alinhar em delírios uma vitória clamorosa, aos que perdendo mais de meio milhão de votos e a maioria absoluta ainda esgrimem argumentos de vitória extraordinária, a todos os demais, que independentemente do resultado ou do posicionamento, sempre garantiram a retirada da arrogante maioria absoluta dos socialistas, e um crescimento com cheiro a coroa de louros.
O país está falido, não temos nem justiça nem educação, as pessoas correm sérios riscos quando deambulam nas ruas, e os assaltos e o crime violento cresce, o desemprego aumenta, as empresas fecham ou não pagam salários, teme-se o futuro, trabalha-se para garantir pobreza, não temos dinheiro, não encontramos ânimo para prosseguir, mas toda a gente cantou vitória de umas eleições em que não se encontram motivos concretos para sorrir. As vitórias, para quem as obteve, são coisinhas bem efémeras, sem história e as tragédias, mesmo ocultas na permanente comédia, só servem para servir em lume brando, e para risada geral.
Sentimos que ainda existimos, mesmo que muitos tenham a dúvida se isto é viver, e não possuindo quaisquer certezas no dia de amanhã, vamos nos arrastando hoje mesmo, aqui e agora. Sorridentes caminhamos lado a lado com a nossa própria desgraça, deleitados nas vitórias do partido como no jogo da bola do nosso clube, esperando que um outro futuro, que não este, venha tão certinho, trazer-nos um novo campeonato, como uma nova epopeia nas competições europeias, ou na divisão de honra.
É preciso resistir, pouco mais se pode pedir a quem olha. Resistir, o mais possível, enquanto o país festeja, feliz e sem inquietações, mais uma vitória de todos, mais um acto, mais um jogo, olhando já, noutro acto, noutra vida, noutra alegria, que não deixará de verificar-se, com novas eleições, que não deixarão de realizar-se.
Melhor assim, pobres mas alegres, sem caminho mas esperando. Que país…

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Viva a corrupção…

Viva a corrupção…

Medina Carreira dizia ontem num programa televisivo que não conhecia em Portugal gente importante na cadeia, ou a caminho dela, por prática de crime de corrupção. Dizia aquele economista que juntando duas ou três pessoas entendidas nestas matérias de justiça, sugerindo mesmo um magistrado que conhecia, facilmente se encontraria maneira de pôr cobro a essa chaga que atormenta o país. Deu também o exemplo do que aconteceu ao antigo ministro socialista João Cravinho, afastado para um eldorado no outro lado da Europa, para manter bem longe, da vista e do coração, as propostas que aquela individualidade apresentou para se acabar, imaginem só, com a corrupção em Portugal. O conjunto de medidas apresentadas arrepiou meio mundo, e tomou de pânico a classe política.
Cada vez é mais claro que os políticos não só se mexem bem entre os meandros da mais esmerada corrupção, como precisam dela, como de ar para respirar, tudo fazendo para mantê-la bem viva e actuante.
De tal modo a corrupção é um elixir milagroso para um punhado de gente instalada nos comandos do país, que em matéria que seguramente garantiria um punhado expressivo de votos, dada a repulsa que cada vez maior se sente entre as gentes e a promiscuidade existente entre a classe política e todo um elenco de atitudes e comportamentos adoptados entre os políticos com visíveis frutos, em tempo de campanha eleitoral ninguém fala em compadrios e corrupções, em troca de favores, em tráfico de influências, ninguém ousa tocar em assunto tão sensível, que faz claro dando ao país, minando as suas forças, diminuindo a sua capacidade de prosseguir.
O país está mal, mas é evidente que entre a legião de políticos, entre os militantes dos partidos com responsabilidades governativas e de maior representatividade, reina uma desleixo, um deixa andar, que bem comprova que anda todo um povo a reboque da falta de ética e de princípios de meia dúzia de oportunistas que vivem do tacho e de expedientes fáceis. Parece mesmo que a muitos que não conseguem vingar no meio dos imorais expedientes instalados, não choca o que acontece, o que se faz, a rotina, entristece é a inabilidade, ou a falta de conhecimentos, para fazer como os demais, e enriquecer facilmente. Não se condena o crime, apenas se fica triste da incapacidade de o cometer e, desse modo, garantir um favorecimento.
Só existe corrupção em Portugal porque os sucessivos governos, e toda essa gentalha que come do orçamento, engordam felizes no sistema. E o povo, coitado, bem, entre a espera de um favor do vizinho que subiu na vida e dirige uma repartição, ou do primo que sem saber ler nem escrever é secretário de um governador, ou do amante que garante mais um contrato na administração do estado, o povo, bem coitado, continua a votar, sem esperança, mas mantendo o regabofe, bem trágico de um país cansado, imoral, injusto e feudal. Porque meia dúzia de corruptos assaltaram o poder e vivem disso. Felizes. Prósperos.
O povo, continua a votar, a cumprimentar quem lhe estende a mão, nas alegrias farsantes das campanhas eleitorais de rua, a fingir, a sorrir, quem sabe se um dia não vamos precisar do doutor, ou do deputado, ou do filho de A ou de B. Mais vale sorrir, curvar a cabeça, dizer que sim, ou mesmo um aplauso, – cá por dentro fazemos um manguito – quem sabe se com essa simpatia, não se garante amanhã, um pequeno favor.
Afinal tudo isto á bem pouco, e em velocidade imensa para minguar, bem melhor é fazer que sim, que se é, deste, e de aqui a pouco se necessário do outro, e de toda a agente. O que é preciso é entrar no carrossel, e viajar com música, subindo sempre, preferivelmente, cómodo e tranquilo. Viva a corrupção.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Não vou votar...



Ouvi mais ou menos com atenção os debates dos líderes dos principais partidos políticos portugueses, por este tempo de começo de campanha eleitoral para as legislativas portuguesas.
Dificilmente equacionarei a hipótese de sair de casa a votar. É, uma perca de tempo. E uma maçada.
Teria de convencer-me da utilidade de participar no acto eleitoral para o fazer e, pelas razões que passo a expor, estou convencido da inutilidade total. Senão vejamos;
- No meu círculo eleitoral são eleitos dois deputados, e não havendo, como previsível, uma revolução sem precedentes e inimaginável, será uma divisão, um para cada lado, entre os dois partidos maiores. O PS e o PSD, a fome e a vontade de comer, os que nos prometem o mesmo de sempre, pouco e mau, não fora a conversa fiada. Os que enganam e os que enganaram, os que estão hoje e os que estiveram ontem.
- Qualquer voto que pudesse colocar na urna, em sentido de um qualquer outro partido, morre aí, num número sem qualquer valor, a não ser, eventualmente, num número final de votantes naquele partido ou movimento e numa percentagem perdida entre milhentas que naquele dia andam nas bocas do mundo.
Não servindo de nada o meu voto, por não ser colocado num dos dois partidos vencedores antecipados, não vejo qualquer serventia, ao acto masoquista de intervir numa rotineira acção que, escudando-se na responsabilização dos cidadãos em participar nas decisões que poderão afectar a governação do país, não atribui ao meu voto qualquer valor, remetendo-o, e tão só, para um género de listagem estatística, tipo resultado de uma qualquer partida desportiva, ou concurso televisivo.
Sendo que os dois maiores partidos são os quase únicos responsáveis pela tragédia lusa, não esquecendo de meter no saco a legião de cabecitas pensadoras que os têm elegido – não se deve esquecer que cada povo tem o governo que merece, no caso que escolhe – e, que os outros grupos de ideias organizadas politicamente, não convencem de modo a ser alternativa, muito menos no meu círculo eleitoral, onde concorrerem ou não, é só questão de estar presente, efectivamente não colhe aqui qualquer dever de escolha, porque simplesmente ela não existe.
Creio que a criação de um círculo nacional já remeteria para o mesmo saco todos os votos de todos os círculos, tornando úteis as decisões subscritas através da cruzinha, e dando, deste modo, uma resposta concreta, objectiva, mais real, a todos os votos colocados em qualquer lugar. Mesmo daqueles lugares, onde o número de pessoas, com o método tradicional, por ser tão pouco expressivo, se encontra enfermo da submissão, da tirania, de um ou outro, esquecendo os demais. Deste modo, poderia, pensar-se numa mais efectiva proporcionalidade que afinal mais não é que o respeito rigoroso pelas opiniões do universo de cidadãos.
Ouvi, sem grande ânimo os debates e mais debates. Quem mal fez não consegue fazer um “mea culpa”, não tem a humildade para dizer que errou e que deve emendar-se o erro, dando a mão à palmatória, e o que nada fez, com ar de uma inocência que já não convence ninguém – ainda há pouco tempo fazia igual ou pior daquela que está na governação – esgrime argumentos deitando abaixo o seu opositor, e tentando convencer o Zé povinho, que teria feito mundos e fundos, e tudo andaria bem, se por ali estivesse.
É um desconsolo ouvir esta gente. Nada fizeram de mal e o país caminha para uma santa desgraça sem qualquer hipótese de mudar de caminho, mas vão fazer bem, sem limites e sem fim, se o povo – que tudo sabe agora – reconhecer a sua mensagem e o premiar com a sua escolha.
Vamos continuar nesta tragédia, bendita, perpétua, vitalícia, de enterrar o futuro, de desmoralizar quem tem vontade de fazer alguma coisa, de nos mantermos apenas à tona da água, ao sabor das correntes, sem rumo, à espera de um qualquer milagre que nos levante o olhar quando caminhamos pelas ruas, que nos faça sorrir ao olhar o nosso vizinho pela manhã, que nos leve a crer que estamos num mundo de elite, por direito próprio e por tudo o que fazemos.
Daqui a uns anos, possivelmente bem poucos, voltaremos a ouvir mais debates, e a votar, e a caminhar, à deriva, como de costume, sem energias e sem esperança.
Votar, nestas condições parece-me, mais que um aceitar do pandemónio, um desistir, acomodando-se a um existir sem qualquer vida. Sem alegria. Sem horizontes. Votar, parece um dizer que sim, quando toda a nossa alma vai perdendo entusiasmo, e o nosso corpo recusa esforço, por ter deixado de acreditar.
Não votar, parece-me, é estar ali, nos que não pactuam com a farsa, não aceitam o caminho que tudo levou, que desejam participar, sem dúvida, quando o jogo tiver contornos sérios, e não de batota, como hoje sucede.
Por tudo isso, vou manter-me, atento, mas não sairei de casa a votar. E, pelo menos tenho sentido uma coisa, em bom rigor, desde que deixei de votar, mais nenhum partido político me decepcionou, nem mais nenhum político me enganou. É isso, já não me enganam ,não voto. Enquanto sentir essa vontade. E a bem da minha consciência.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Que anjo...


A política é uma comédia sem paralelo. Ontem, depois do jantar, sentei-me tranquilo a ver a entrevista à RTP1 do primeiro-ministro de Portugal. Ar inocente, angelical mesmo, o senhor Sócrates tentou com voz serena, sem sobressaltos, explicar que ousou fazer tudo, o possível e o impossível, para melhorar Portugal, que, na sua opinião, não tem nada a ver com o país que encontrou quando há quatro anos começou na governação. Melhorou o país, muito se fez, e confia que os portugueses não deixarão de reconhecer tudo o que se tem feito. Mesmo em relação à crise, que em todo o mundo criou amargos de boca em empresas e nos povos, não deixou de salientar que, ao contrário do que muitos velhos do Restelo apregoavam, encontrou o seu fim no nosso país muito à frente de outras economias que ainda sentem aqueles nefastos efeitos. Aceitou que teve momentos de firmeza, que alguns confundem, sem que se justifique, com teimosia, e eventualmente terá sido incompreendido por alguns corpos profissionais, como ocorreu com os professores.

Mas promete, o senhor Sócrates promete, depois de quatro anos em que não deu quaisquer ouvidos a uma classe profissional que levou dias e dias protestando com todos os meios legítimos e possíveis de que dispunham, promete agora, que se ganhar as próximas eleições tudo vai fazer para voltar a conquistar a confiança daqueles profissionais.

Que anjo…

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Com crise e sem qualquer classe




Falta de classe

O engenheiro Sócrates perdeu a oportunidade de ser legitimamente considerado o melhor governante de Portugal depois do 25 de Abril de 1974. Poderia ter sido o primeiro ministro mais marcante positivamente falando do Portugal democrático. Teve coragem, trabalhou, fez, defrontou-se com as anquilosadas forças que sempre se revelam contra qualquer intenção simples de reformar, enfrentou a maior crise que fustigou o mundo nos últimos anos, mexeu e remexeu em muito que necessitava ser ser mexido, fez muito mais que qualquer outro antes dele, enfrentou importantes grupos e corporações, goste-se ou não dele, tem que se reconhecer que iniciou um caminho, não desistiu, fez obra. Todavia, corre o risco, será uma ironia da nossa história actual, de sair pela porta dos fundos, e de perder uma eleição para a governação do país, a favor de uma candidata a primeira ministra que em condições normais nunca governaria Portugal, por possuir uma imagem pública demasiado pesada e de outros tempos, e por passado em governos anteriores onde deixou marcas de pouca flexibilidade e sensibilidade, apresentando uma imagem de muita dureza e teimosia.

A culpa é toda dele. Sócrates foi longe de mais. Foi prepotente no trato, desafiou desabridamente demasiada gente. Foi inflexível e penalizou sem a menor sensibilidade uma quantidade de pessoas. Foi mais longe o engenheiro socialista, e enquanto arrogantemente defendia as suas políticas, não sem um sorriso hipócrita de quem tudo sabe e a quem todos têm de se submeter, ao mesmo tempo, apregoava trucidar gente, não desviar um milímetro do seu caminho, doesse a quem doer, tivesse ou não razão.

Estragou, como um menino de birras impaciente e mal educado, toda uma labuta que lhe chegou a granjear elogios das mais variadas instancias, nacionais e estrangeiras, ao levar, efectivamente, longe de mais, a sua teimosia, a sua inflexibilidade, o seu ataque a quem se lhe tentava opor, a sua arrogância.

Fez um ataque como nunca se tinha visto em Portugal aos funcionários públicos, que praticamente aniquilou por decreto, tendo, unilateralmente, alterado o seu tipo de vínculo com o estado, destruído as suas expectativas de carreiras, aumentado o seu tempo de trabalho para a reforma ao mesmo tempo que se diminuía o seu montante, isto, sem respeitar os direitos que muitos detinham por uma vida ao serviço da coisa pública e que de um momento para o outro se acharam, com o futuro virado do avesso, sem expectativas, e desrespeitados. Não ocultou a vontade de despedir a todo o custo, ignorando que seria mais sério deixar sair quem uma vida dedicou ao trabalho no Estado, que criar mecanismos de duvidosa legalidade para mais tarde lhes pregar um pontapé no traseiro.

Quando apostou na educação, fez o maior ataque e achincalhamento possível à classe dos professores, tornando-os pior que coisa nenhuma, sem qualquer valor, e desclassificados na praça pública. O povo assistiu atónito a professores impedidos de se reformar com cancro na língua, e outros casos semelhantes. Contra tudo e contra todos, desprezando um expressivo descontentamento que se manifestava como nunca se vira, um pouco por todo o lado, o ataque aos professores fez-se de todas as maneiras e sem qualquer respeito. Era malhar até poder; impor sistemas de classificação de serviço de duvidoso efeito e de uma complexidade e burocracia impensável; impor a destruição do sistema de carreiras trocando-o por um outro que não foi aceite por ninguém, foi asfixiar os professores horas e horas nas escolas, envolvidos em tarefas de todo o tipo; foi o confronto, excessivo, arrastado, mais vale partir que torcer, até onde desse.

Tenho para mim que um pouco de bom senso, que um pouco de humildade, que uma dose certa de diálogo, teria apaziguado a revolta nos professores, teria consolidado as reformas no sector, e teria galvanizado toda uma classe para um projecto da maior importância para o país que é ensinar e educar.

Igualmente penso que poderia ter-se evitado a destruição do “funcionário público” impondo-lhe, à força, um novo tipo de contrato unilateralmente e de duvidosa constitucionalidade, e deixando sobre a cabeça de tanta gente, a ameaça de um futuro sem qualquer segurança, e um sistema de progressões praticamente para meia dúzia de afilhados e escolhidos. Destruiu-se todo um sistema, que poderia necessitar de reformas, mas não de ser trucidado, deixando, curiosamente, como antes, os eleitos políticos, a servir sem qualquer exigência prática, fora do sistema que se queria moralizador das classificações, ou seja, do mérito como alavanca de progresso.

Esqueceu-se, por inconfessáveis interesses, a luta contra a corrupção e o compadrio que mina o país. Esquecem-se as legitimas expectativas e justos anseios de muitos jovens portugueses que desejavam ser médicos, num país onde, inexplicavelmente, não produzimos os quadros médicos que necessitamos, e depois de barrarmos o acesso aos nossos jovens vamos recrutar médicos de outros países e outras línguas.

A insegurança nas ruas um pouco por todo o país, e nos campos entre a gente mais idosa nunca foi tanta. A gente grada continua em estado de excepção, ziguezagueando com os tribunais e os códigos de leis, aparecendo nos telejornais, protegidas por nomes sonantes do direito, enquanto a arraia miúda foge da justiça como o diabo foge da cruz a sete pés. Condenam-se os pequenos por dá cá aquela palha, e conhece-se tanto figurão que se passeia feliz enquanto o respeito e a civilização exigiria que estivesse dentro. Os agricultores não têm onde colocar os produtos e empobrecem, ao mesmo tempo que se tem conhecimento público que o ministro da agricultura não aproveitou fundos comunitários que se destinavam ao melhoramento da nossa agricultura.

Fez-se muito, ignorá-lo não parece sério. Mas o que não se fez e que poderia facilmente ter sido feito, e todos os excessos que se utilizaram provocando revoltas injustificadas em muitos milhares de portugueses, acabaram por encher de sombras um governo que poderia brilhar. Teve tudo para isso. Infelizmente, por falta de classe, só nos espera a manutenção na sombra, por muitos anos - já estamos habituados a uma monótona e triste falta de inspiração luminosa - esperando ainda, esse Sebastião, que numa manhã de nevoeiro não deixará de vir governar este povo órfão. Tardará ainda esse dia, e até lá, muitas sombras, como estas por que passámos, não deixarão de tirar sorrisos aos portugueses. Nem de lhes dificultar o futuro.

Que país… onde, ou não se faz, ou quando se faz, melhor se nada se tivesse feito. Onde se perpétua a falta de classe, a falta de cultura e de educação, e onde, a arrogância, a prepotência, a teimosia, ainda são apanágio de muitos sequiosos de se afirmar. De outro modo, já se vê, manter-se-iam ignorados. Que país, que falta de classe.

sábado, 29 de agosto de 2009

Espera una idea nueva... (upsssssss...)





Não existe nada pior que querer fazer algo mas não encontrar nem talento nem forças para criar. O talento já por si não acorre em abundancia, as forças muitas vezes não resitindo às intempéries dos nossos tempos soçobram, quedam-se, sem energia, sem genica, amorfas, à espera de melhores dias.
Atrás da falta de uma ideia, de um sopro com algo interessante, e querendo a todo o custo tornar cativante um dos meus blogues, lembrei-me - o que já aconteceu numa ou outra situação - de colocar algumas fotos novas, dando, a algum visitante regular, a ideia, não totalmente verdade, de novidade, de mais alguma nova coisita para ver.
Desgraçadamente, já o diz a sabedoria do povo, um mal nunca vem só, e querendo fazer sem ovos uma cativante omoleta, logo fui entornar os ditos no blogue do lado, deixando os eventuais visitantes do meu blogue Latino, sem nada de novo para ver, e abrindo um precedente de cujas consequências não estou em condições de adivinhar agora, colocando estas imagens, num espaço meu que queria apresentar tão sábio e sério, que deveria ter, no mínimo, o que se entende aqui onde se espreita o saber e o conhecimento luso e se vê, pois claro, um descolorido de época quaresmal, sem brilho, nem cor, nem, quase, coisa nenhuma.
Tirar as fotografias além da trabalheira, apresenta riscos sérios, pois nisto dos blogues, que pode não parecer, mas apresenta alguma complexidade técnica, muitas vezes, não fora a disponibilidade da minha filha mais nova, ficava completamente às aranhas, não sendo capaz de muito mais, que uma desistencia assumida e um desligar despeitado do sistema informático.
Assim, assumo perante os milhares de leitores que me visitam aos encontrões - já se sabe que não é fácil tanta gente a fazer a mesma coisa em simultâneo - que as imagens dessa praia imensa no sul de Portugal, fazem parte da peça, intelectualmente preparada, e que com esmero detenho em mãos, de explicar que o país parou, mesmo que não pareça em face dos costumeiros resultados de outras épocas, para banhos. Melhor dito, depois da intensidade de onze meses a não fazer - obrigado aos que estiveram calmos todo um ano - de alguns, a que se juntou a trabalheira de outros, que se crê, serem quase raros, chegaram as merecidas férias. E o povo, farnel às costas, rumou às praias do sul, botando figura, e escurecendo ao sol.
A classe política por uma falta de imaginação assustadora ainda se junta democratimente com o populu minuto, e assim, quando necessário, aparece na televisão, com o mesmo ar alegrote das massas, enegrecidos de horas e horas a estragar a moleirinha já de si de uma pobreza fransciscana, que os negros recomendam-se e estão, diz-se por aí, na moda.
Tudo se banha, tudo se torra, entre um pratinho de caracóis na casa de pasto do José do Touro Mansinho, e uma imperial cheia de espuma. Isto é que é vida pensa mais de meio país, procurando à conta de um psicológico embuste, enganar-se a si, e afinal aos demais, esquecendo, ou fingindo esquecer que mais uma crise parece querer ir, o que determinará a emergência de se inventar uma nova, que o trabalho, ou a caminhada de arrasto para o emprego não deixará de vir também, que a malfadada gripe não dá acordo, não se percebendo se é ou não para ter em conta, se é mais uma patranha para trazer entretidos os populares, esquecendo por fim toda essa eterna cruz que arrastamos à séculos, de atrairmos - parece sina - a pior gentalha para a política, que nos dão cabo da vida e do país, enquanto lhes damos a mesma importancia que na praça de touros ou num campo de bola, atribuímos aos protagonistas, assobios e palavrões, choros e gritos, ameaças e protestos, beijos e abraços.
Que ganda povo...
Lá longe, fala-se, parece que vai haver eleições. Será? Hummmmmmm, quem quer saber, agora estamos de férias, está calor, toda a gente se parece cada vez mais com o Obama, é bem melhor dar mais um mergulhito e olhar para a vizinha do toldo do lado, na água agora, mais tarde logo se vê.
Para quê pensar em desgraças... para pior está bem assim, e lá irá meia dúzia votar, outros temendo o contágio da gripe nos boletins de voto, que á afinal a pior gripe que existe,a eleitoral, não sairão à rua. Para quê?






quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Desgovernos e promiscuidades...

Atendendo à confusão que sempre reina em embarcações à deriva, e à inegável parecença entre este pobre país e um qualquer navio perdido sem rumo e a meter água, não posso deixar de parar um pouco para tentar reflectir sobre o que se me afigura neste desatino que sempre conheci pouco mais ou menos assim, de um povo, tal como a tripulação da nave em perigo, à beira de uma catástrofe.

Não parece haver qualquer mando claro neste desordenado e desmotivado exército que recusa enfrentar qualquer inimigo ou a bater-se em monótona batalha, por todas e quaisquer razões, onde é bem visível a falta de qualquer ânimo, onde de pequeno se aprende, como a olhar ou a falar, tudo simples e fácil, a encolher os ombros, a deixar passar, em nada ver, em fazer apenas o que já se faz, e quando não se vislumbra meio de evitar trabalho, – é tão bom ser pequenino, e nada fazer – e que, como é bom de ver, não se recomenda.

Parece que deveria ser o governo a governar, mas logo se levantam pertinentes dúvidas ao ouvir que aquela gente recusa culpas no cartório, ou responsabilidades pelo que se fez, – e pelo que não se faz – parecendo, em boa verdade, que todas as asneiras que nos têm condenado a seguir amorfos na cauda da Europa, e só nos mantendo aqui, porque nos levam a reboque, são avulsas, sem dono, obra do Espírito Santo.

Também decorre de simples exercício lógico que os melhores governos dos últimos anos, ou do período simpaticamente designado de democrático, são sempre aqueles que menos duração tiveram, não porque em pouco tempo se pudesse assistir a um milagroso feito, de fazer e fazer bem, mas apenas porque o tempo para fazer porcaria, por reduzido, obrigou a sua produção a minguar. O que, já é positivo.

Em Portugal quando se fala em fazer reformas o povo teme, de imediato, pela desgraça que inevitavelmente não deixará de lhe cair em cima. Em nome da modernização, que não tem nada a ver com o nosso mundo, cada vez mais atrasado da civilização e do progresso, faz-se qualquer barbaridade, destrói-se, dando cabo do que ainda se fazia, mesmo que não tivesse grande qualidade, por algo garantidamente pior. É a nossa sina. Levamos a vida a reformar, e a dar aos que nos substituem novos argumentos, face aos resultados, para começar novo finca-pé reformista.

Os governos sucedem-se, entram como se tivessem acabado de ser esterilizados, sem mácula, virginais, e com o passar do tempo vão se conspurcando, ininterruptamente, até atingir um tal estado de podridão, que o povo, descolorido e sem cantar, vai a correr buscar aqueles que entretanto, depois de igual processo de decomposição e mau cheiro, estiveram em banho maria algum tempo, a ganhar brancura e saudável cheiro. Uns voltam à desgastante actividade de perder cor, ganhar cheiro, e vender a alma, a bem da nação, e por interesse público, procurando manter-se o mais tempo possível em aceitável estado de limpeza, enquanto os que saíram entregam-se pacientes a uma desinfecção, a uma lavagem, que levará tanto tempo, quanto o cheiro dos que ocupam a manjedoura pública, não se tornar totalmente impossível.

A alternância não se faz por um projecto, por uma ideia, por crer na capacidade de trabalho, mas porque a sujidade chega a tal ponto que tem de se fazer uma desinfestação e buscar substituto. Só crê nessa patranha do espírito de missão, na competência e dedicação, e da obra a fazer, quem também come do caldeirão e tem por isso interesse no cozido, ou meia dúzia de ingénuos distraídos. Naturalmente, os glutões, que sempre comem em qualquer panela, e comem de tudo, esperam tranquilos a mudança de cozinheiros, enquanto, sentados à mesa, ajeitam o guardanapo.

Os que chegam, descobrem quase sempre, depois de milhentos exercícios de pesquisa, que os que saíram deram cabo de tudo. Que é preciso mostrar eficiência, mando aprumado, sério, que se necessitam novas políticas, urgem tomar medidas, decidir. E como tudo estava no caos – Deus nos livre – vem aí os exorcismos.

E o mundo gira sempre assim. Saem e entram. Sem culpas nem temores, encantados e satisfeitos, consciências a brilhar, inocentes. Os outros, sempre os outros, que estiveram antes, da outra cor, da outra gentalha, irresponsáveis, é que deram cabo de tudo. E segue a contradança, com o povo cada vez mais pobre, com o número de pobres a aumentar, com as empresas a fechar, com as reformas a cair, com tudo a voltar ao tempo, não longínquo, em que, dentro de uma Europa que se mostrava ao mundo desenvolvida e justa, parecíamos uns mal educados maltrapilhos.

Parece desgovernar-se, nas alturas das decisões magnas, e nas repartições do estado, nos institutos públicos, nas empresas onde o poder mantêm os amigos e afilhados. Tudo muda, a uma velocidade expressiva, alterando todo um equilíbrio que levou séculos a tentar-se atingir. Para pior. Miúdos saídos dos bancos da universidade, ou corridos sem que se conheça a razão das empresas privadas, tomam de assalto os lugares de chefia e direcção no regafobe da coisa pública. E passam a dirigir, de um momento para o outro, indivíduos que tinham uma vida de dedicação à causa pública, e toda uma experiência acumulada. São os boys do regime, são os filhos dos amigos, são este e o outro, e mais aquele, que de modo inexplicável tomam o comando do país e das suas coisas.

Num caso especula-se que é uma cunha directa do governador civil, mais adiante sussurra-se na força e influencia da maçonaria, no outro a importância da opus dei, aqui fala-se nos filhos de uma amiga da presidente, ali no sobrinho do dirigente local, na namorada do filho, na filha da porteira, na amante, no tio, no amigo…

Nem se vislumbra em bom rigor a existência, como já em tempo se pensou, de uma partidocracia, que seria seguramente, do pior o menos. Estavam todos da mesma cor em um dado momento e quando se procedesse à troca por desinfecção do pólo principal, assistiríamos a uma troca por aí abaixo, de cor, em tudo e em todo o lado, o que ajudaria a manter o país limpo. Mas isso não ocorre, com a salada de pressões de todo o género, as trocas de favores, os que se metem do campo adversário – mais para conquistar a benevolência quando estes voltarem ao mando, que para mostrar isenção na escolha de gente, - com os a quem se devem favores, a família, o amigo, o lobby local, o regional, a instituição, ninguém se entende.

É a gente que comanda os destinos do país, a bem dizer, que asfixia o povo, emagrece o Estado, delapida o património, decide, manda fazer, coisa pouca ou nenhuma, que agita, que provoca, que transforma este canto do mundo, onde deveria ser belo viver, num país sem sonhos, sem equidade, sem leis, sem justiça, sem alegria e sem entusiasmo.

É essa gente, que não se entende bem quem são, tal a promiscuidade, e a imensidão de lugares de onde emergem, muitos sem qualquer qualificação, muitos sem qualquer moral, sem preparação, sem saber, que conduzem um povo, neste mundo cada vez mais competitivo, entre nações.

Portugal só poderá caminhar em frente, rumo a um futuro a que todos deveriam ter direito, quando se vir liberto de tanta falta de competência, da corrupção e do compadrio, quando as pessoas se envolverem em equipa na procura de alternativas, e se lancem ao trabalho, criando e entregando o seu esforço e o seu entusiasmo, em busca de objectivos claros, que sejam desejados e assumidos por todos. Uma grande equipa não deixará de fazer uma grande obra, mas para isso, todos, desde os que assumem maior protagonismo e dirigem ao mais pequeno executante, todos devem ocupar o lugar certo, para de modo concertado se proceder à verdadeira revolução de fazer andar uma máquina há muito emperrada.

Quando se conhecerem claramente as coisas e quem é responsável ou não por elas. Quando a irresponsabilidade seja chamada a prestar contas, e se exerça a coisa pública com princípios de seriedade, de ética e de dever pela boa governação.

Enquanto tudo continuar neste desnorte, em que nada é certo, nada é claro, ninguém tem culpas, ninguém sabe, ninguém quer, bem, enquanto tudo seguir assim, apesar do contentamento de uma minoria que não tem deixado de engordar, manteremos o país adiado, enfermo, sem capacidade de correr, de competir. E continuaremos a fingir que existimos, a ver passar os comboios, e a meter a cabeça debaixo da areia como a avestruz. Sem sonhos, sem riqueza, sem vida. Existiremos apenas…

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Precisa-se um “Português Suave”

Desculpem, aqueles que por distracção entram aqui, neste espaço, que vaidosamente, rotulei de “Kampus Libertatis”, a maçada imensa que não é ler, tanta arrazoada, inconsequente, e tão sem graça, nem ciência, dum ror de palavreado sem fim. Pior mesmo é ter que ler tudo, creio que a pequeníssima maioria dos ínfimos leitores, abandona, entre um bocejo e um esgar de raiva, esse perder de tempo que é seguir palavra e mais palavra, sem rumo, nem sentido, a salto.

Este campo é mais que sair “a salto” – como procuravam os que no tempo do fascismo e de outras misérias, buscavam em terras distantes, um pouco de comida para os dentes e um sopro de dignidade – sendo, um verdadeiro pulo, no que se escreve, isento de esmeradas inspecções revisionistas ou pidescas, fora de controlo, num campo sem fim, pleno de tudo, que mais se assemelha em bom dizer, à liberdade.

Pode não existir aqui nem sabedoria, nem os requintes que a técnica introduz um pouco por todo o lado, nem o rasgo doiradinho de uma mente bem conseguida, mas, seguramente, o que se escreve, acaba por ser, uma mistura descontrolada de tudo o que se sente, o que se pensa, o que muitas vezes se procura esconder, e a almejada, sempre, razão, que tantas vezes procurava estar, mas não menos vezes, falta por culpa própria ou mesmo alheia.

Escrever é coisa de gente estranha, que procura num quimérico conjunto ordenadinho de palavras, uma finalidade, que muitas vezes nem se conhece bem, mas que existe, que está ali, por detrás da caneta, escondida, agachada entre as teclas do computador, e que saltando à luz, parte à conquista, de ganhos em bens, ou em satisfações, mais ou menos controláveis, em intelectualidades geniais, ou em musicalidades poéticas, de quem já não espera, nem sabe.

Escreve-se de e por tudo. Para dizer mal do vizinho que trocou o burro quezilento no curral, por uma garagem de mosaico e azulejo com um Mercedes dentro, luzidio e arrogante. Suja-se papel para enaltecer o compadre autarca que foi reconduzido mais uma vez para satisfação de um séquito de amigalhotes, de engenheiros de obra a aviar, e de outros que procuram manter-se, paulatinamente, à manjedoura atulhada. Diz-se muitas vezes mal da situação, da falta de genialidade, dos caminhos tortuosos por onde o país sempre desliza, sem que caía, ferido de morte. A escrita parece sarar as feridas que sempre teimam marcar o percurso de gentes e mundos, perdoa erros sem fim que nunca vamos deixar de fabricar, uns a seguir aos outros apesar das promessas, limpa manchas conspurcantíssimas, fétidas, e muitas consciências que de outro modo não conseguiam descansar em cada noite.

Escreve-se por vaidade, por conseguir em boa mestria resultados de excelência no entrecruzar de verbos com substantivos, e no meio da salganhada, catapultar dentro do alguidar do texto, adjectivos, de modo e de lugar, e afinal tantos outros que as gramáticas evitam, por exagero, desenrolar em público, e ainda, saltam, ali, bem à vista de todos os advérbios, os estilos, as acentuações, e as demais confusões que sempre se perfilam ao catalogar-se, por favor régio, a obra prima.

Escreve-se por revolta, por paixão, para conquistar sorrisos e aplausos, para ganhar respeito e honrarias, só não se escreve a mais das vezes o que deveria fazer-se, e de modo limpo, certo, audaz, escrever a verdade. Simples, sem quês, nem senões, tudo luz, de oiro, clara, sem dúvidas e sem erros.

Escreve-se, bem as palavras são como as cerejas, seguem-se em tal velocidade e sem parar, de tal modo, que transformo audaciosamente, tanto, como sem querer, nem saber, num descargo de consciência, num teclado meio doido, uma página qualquer, para encher o blogue.

Precisamente quando procurava dizer mal de tantos intelectuais de botica que pululam em cada lugarejo do país – pequeno mas cheio de espíritos prenhes de prendadas riquezas – que escrevem sobre o que sabem, pouco, como não sabem nada, muito fazem de adivinhação, e de procura, de ânsia, de descoberta. Assim nasce muitas das vezes o novo conhecimento, da procura, com ou menos ordem, som ou sem método, sem ou com saber, resultando da simples coragem de viver apregoando asneira, prometendo impossíveis, mostrando tolices.

Num país onde desde o jogador de bola, à apresentadora de programa de entretenimento, ao artista de folhetim e revista, ao cantor, todos escrevem livros, tudo escreve, tudo sabe, a grande dificuldade é a escolha, em bem rigor, do maior, já que, para bem de todos, muitos estão na nata, do saber e do conhecimento. O que dificulta a selecção, quando entre tantos se necessitam apenas um punhadito de gente capaz. É um país de magos, reis e piões, mas todos magos. Em equipa ou fora dela, sós ou com os amigos e a família atrás.

Preocupa-me este eterno exagero que sempre tivemos e que tanto nos tem dificultado o caminhar. De termos gente a mais sabendo tudo, génios em economia e finança mas que a bem dizer não teriam dificuldade em diagnosticar uma gripe, médicos e cirurgiões tão capazes de manter vivos sem prazo qualquer utente dos serviços de saúde como de gerir a Junta Nacional dos Vinhos ou um apeadeiro da CP, magistrados capazes de aviar com perícia e entusiasmo tanto um simples café com creme, como fazer a mais apaladada tosta mista com queijo flamengo y fiambre da pata de cervo, policias capazes de dar aulas de direito fiscal, e fiscalistas entusiastas das coisas da saúde oral, políticos mais interessados na coisa do alheio e que fácil desliza que no interesse público. Enfim, a nossa dificuldade é sermos muito mais e estarmos muito à frente, no tempo, na vida e na praça.

Por isso temos dificuldade em seguir o caminho, que para outro se afigura fácil mas a nós nos tolhe o passo, não por pequenez, é bom assinalar as vezes que necessárias se mostrarem, mas porque, a imensidão de competências que temos, o jeito, o zelo, o espírito de missão, a capacidade de trabalho… bem, em bom rigor, quando tudo isso se junta, como normalmente acontece com o mediano português, é a explosão tão intensa, tão virulenta de uma incontida genialidade que se afirma, que na maioria das vezes, recomendaria a prudência, para evitar os danos de tamanha potencia espalhada aos sete sentidos, não se fazer nada.

Procura-se gente. Deveria ser este o mote. Pessoas. Seres humanos normais. Para a governação do país, para a justiça, para a educação, para a saúde, para a polícia, para os campos. Sente simples, que dorme de noite, que descansa pelo menos uma vez por dia, que come, que arrota depois de comer, que toma um banhito de vez em quando (que isto de poupar água e velar pela manutenção da pele em condições tem que se lhe diga), que às vezes faz asneira, que pragueja, que grita. Precisa-se um português suave, daqueles de antigamente, do tempo da reconquista, ou dos descobrimentos, daqueles que se encolhe quando lhe grita a padeira, descontrolada, de pá nos ares, volteando sem direcção, mas que pela calada da noite a faz gemer, entre lençóis. Precisa-se o português de outrora, fadista, de nariz vermelhusco do tinto, brigão, bom companheiro e de palavra certa. O de hoje, sem palavra, pouco equilibrado, a cheirar a flores e em emersão de manhã à noite, paninhos de lã, sabichão, que treme cada vez que a mulher tosse, e se esconde da gritaria e das reivindicações dos filhos, esse, sábio, culto, moderno, consciente, amigo do planeta, ecologista, só nos poderá enterrar cada vez mais. Não porque não tenha soluções para cada coisa que deve enfrentar, mas porque ele próprio está muito acima de tudo isso, que nem chega a ver, quanto mais a cuidar.

Precisa-se de um português suave. Que, por favor, não saiba muito, nem seja moderno, nem de finanças nem de economista, nem saiba muito de coisa nenhuma. Só se pede que seja português, genuíno, das Beiras, ou do Alentejo, de Trás-os-Montes ou do Ribatejo, que seja suave, mesmo que pegue toiros, e queira governar, este país e esta gente.

domingo, 16 de agosto de 2009

UM CAMPO DE LIBERDADE

Kampus Libertatis

Só podia ter um nome assim este campo, onde desejo, as letras pulverizem sussuros de liberdade, de desejos possíveis, de esperanças, de sonhos de gente, de pessoas, de seres que nunca deixem de ser a essência de um mundo que não deixará de girar, mesmo que os ventos impetuosos que querem calar, fustiguem os nossos rostos.

A liberdade mesmo que não exista de todo, estacionou aqui, quedou-se imóvel, fincou os pés, cravou as unhas, e teimosamente aqui pugnará, entre canções, entre protestos, em rasgos de luz, permanecerá, guiando os meus passos.

Mais que um blogue, um espaço de internet, virado ao mundo e aos outros, isto não é mais que um cofre, pequenino, singelo, meio frágil, onde é possível espreitar o que vai dentro, e que não será mais que um aglomerado de pequenitos segredos, de ideias, de visões, sobre o mundo e a vida, respeitando mais que tudo o homem e a dignidade humana, e o direito inalienável que o mesmo possui de seguir livremente um caminho que o leve a viver com tranquilidade entre e com os seus semelhantes.

Creio que apenas gente distraída entra neste campo de intimidades, de devaneios, de busca de ilusões, sendo mesmo que aqueles que distraidamente por aqui deambulam, ao aperceber-se de um conteúdo tão pouco erudito ou sem ser alicerçado em técnicas ou sabedorias certificadas, logo abandonam a visita, procurando por aí, mundos sem dúvidas, e verdades absolutas.

Este campo abriga a dúvida, e dá guarida aos que pouco ou nada sabendo, procuram reflectir, e nesse acto, aproximar-se um pouco mais do que muitas vezes parece ser, podendo, algumas vezes, ser mesmo realidade.

A liberdade é o voar da ave nos céus, o caminho do homem na terra deveria ser igualmente livre, os sonhos deveriam vogar em desalinho, sem regras nem métodos, num mar, ora sereno ora encapelado, de ondas de sonho.

Escrevo aqui, os desesperos de quem tanto aprecia a liberdade de caminhar em paz, em harmonia, numa relação equilibrada tanto com os outros como com o mundo que nos envolve, desejando, mais que ensinar, ou chamar a atenção – quem sou eu para isso – encontrar algo donde seja possível retirar benefícios ou interesse.

Na busca tenho como finalidade me aproximar um pouco mais do ser que é, da verdade que raramente está acessível, do desenrolar da expedição que todos efectuamos em cada dia de vida.

Preocupa-me o homem, a sua relação com os outros homens, quer se manifeste de uma forma organizada ou não, a do homem com o seu espaço, onde se envolve vulgarmente nos momentos de existência, ou no mundo, que feito por Deus para todos, parece cada vez mais distante de todos nós, e de cada um.

Preocupa-me o meu país, o seu caminho, que mais parece uma marcha fúnebre, apontado a um declínio injustificável e incompreensível, enquanto os responsáveis pela sua governação, - todos eles - sem prestar contas a quem quer que seja, prometem aproximá-lo das modernas democracias do mundo, e enganando as gentes, ajudam a enterrar.

Preocupa-me um povo que parece ter deixado de viver, existindo apenas. Sem sorrir, sem sonhos, sem ilusões, silencioso, curvado. Só meia dúzia de alegres iluminados sugam o que ainda existe, se amanham sem qualquer risco, de qualquer maneira, impunemente, ocupando com ares de missionários as cadeiras do poder e os lugares da administração, de mãos dadas, satisfeitos, arrogantes, enquanto aos poucos o país soçobra, sem nada que se vislumbre capaz de lhe dar esperança, ou alma.

O povo já não sai às ruas a bailar, a dançar, não canta, não brinca, não acredita em dias felizes. Há mais confiança nos números aluados do euromilhões, que teimam em só sair aos outros, que em qualquer promessa de melhorias. A conversa da classe política não convence ninguém. Já não se fazem filhos, parecendo as terras pequenas do interior depósitos de velhos, que morrem cada vez mais em cada dia que passa. E os governos locais na caça de votos organiza excursões e bailes para a terceira idade.

Preocupa-me um canto do mundo, dito civilizado, onde existe tudo de pior, embrulhado nos papéis coloridos da civilização e atados na bizarra guita da modernidade. Deixou de se trabalhar para melhorar o futuro, trabalha-se para aguentar a catástrofe de dias cada vez mais negros que não deixam de nos visitar, sem interrupção hà alguns bons pares de anos. Pede-se mais trabalho, e paga-se, em promessas, com tirar um pouco menos. Que sempre se perdem, rendimentos, direitos, respeito. Parece um voltar ao passado, depois de gerações terem dito não, terem lutado, terem edificado um mundo que parecia caminhar para algum equilíbrio e para a paz social. Por este andar, ainda teremos de agradecer um dia, uma escravatura doirada, que sempre será, dirão os eruditos da praça, melhor que a sem luz, escura, e sem brilho. O povo, esse, sem o sorriso nos olhos, vai aplaudir, - aplaude sempre – e seguirá existindo.

Preocupa-me uma corrupção que todos conhecem, de que todos falam, e de que alguns engordam. Assusta-me o compadrio que nem se procura disfarçar, menos ocultar, um feudalismo de primas donas de cidadela, de favores, e de trocas de influências. Nessa chafurdice alguns constroem o seu império. O governo, a classe política, responde chumbando planos, vetando medidas, anulando, qualquer coisa que de eficaz se possa fazer e que combata esse cancro que mina a sociedade portuguesa.

A justiça não é justa, diz-se quando fora de tempo. Em Portugal ainda se crê – aqui reside muita da sabedoria popular – que mais vale calar, deixar passar, nada fazer, que intentar um processo nos tribunais para ver reconhecido um direito ou ver reparada uma injustiça. Os processos são caros, os ricos e poderosos raramente são condenados, as leis são um emaranhado de complicações, onde vinga, mais que o justo, o expediente, o saber manusear argumentos.

A educação é mais o seu contrário, que um esforço para garantir mais conhecimentos e ferramentas aos futuros profissionais, grassam por aí, inexplicáveis metodologias que podem ser do nosso tempo, mas que o povo não entende, de cursos que se tiram aos domingos, de exames que se podem realizar tranquilamente em casa, de passagens administrativas de alunos sem aproveitamento em mais de oitenta por cento do currículo leccionado. A estatística tem que se manusear para mostrar ao mundo que os portugueses que já foram, noutros tempos, um povo de elite, e de saber, volta a ser um grupo de gente do melhor que há, cientifica e tecnicamente falando. Ataca-se uma educação em profunda crise de metodologias e de valores espezinhando na praça pública os professores. Pisca-se o olho ao voto dos pais, transformando as escolas em lugares de estacionamento, onde se pode estar, sem que interesse de muito se efectivamente o ensino melhora ou não.

A saúde transformou-se num bastião de mercado, de negócio, onde, nem como é apanágio dos países mais cultos, conseguimos assegurar os nossos médicos. Os portugueses não têm médicos de família, recrutam-se médicos estrangeiros para tentar não fechar imensos Centros de Saúde no interior do país, espera-se com bichas desde o nascer do sol, para uma simples consulta. Os jovens portugueses que desejam exercer medicina têm que estudar no estrangeiro. Com o fim de um Serviço Nacional de Saúde que a Constituição garantia ser tendencialmente gratuito, assiste-se hoje a uma clientela de primeira grandeza, os utentes de seguros de saúde, e todos os demais, cujos rendimentos não permitem aceder àqueles meios, estão mais desprotegidos, ou à mercê do favor.

O funcionalismo público, que historicamente era mal pago, mas que recolhia o respeito das populações, foi praticamente substituído por uma coisa que nem se percebe bem qual a sua natureza, sendo modernizado à força com regras de produtividade, avaliação de desempenho, e exigências de tecnicidade, ao mesmo tempo que se alteraram para pior as expectativas dos seus servidores, se diminuiu os seus rendimentos, e se desmoronou todo o sistema de carreiras. Para moralizar ainda mais o sistema, os dirigentes são escolhidos por regras tão pouco críveis, como o reconhecido mérito, que tanto pode ser da cunha, ao favor de amigo, ou ao jeito do compadre. Moralizando mais ainda, estes que deveriam responder pela máquina, nem sequer estão integrados no sistema imposta das avaliações, com que se queria moralizar e requalificar a antiga máquina do estado.

As empresas estão em profunda crise, com trabalhadores com salários por receber, sem capacidade de pagar as suas obrigações quer a fornecedores de bens e serviços, como ocorre também, nas obrigações fiscais e nos pagamentos à Segurança Social, cerrando as portas de modo reiterado todos os dias desde há muito tempo. A isto se deve a existência de um tecido empresarial pouco qualificado e que sempre viu no investimento algum interesse desde que os lucros fossem rápidos, avultados, e fáceis, nem que para isso, se recorresse a maus salários, e num desleixo em matérias como a higiene, segurança e protecção dos trabalhadores. Juntou-se a incapacidade de se modernizarem, quer por desconhecimento e falta de preparação dos empresários, quer, muitas das vezes, por desinteresse.

Os sindicatos quase não existem, e alicerçam-se também numa complexa teia de quadros politizados que se garantem por longos períodos, profissionalizados, nas funções sindicais, longe da realidade do trabalho e das empresas. Grande parte dos sindicalistas permanece como forma de garantir uma forma de vida, afastados da vida laboral e das empresas, e olhados muitas vezes pelos trabalhadores como gente que por ali anda, a tratar de vida.

Muita gente deixou de acreditar nos partidos e na política. Sendo ideia comum que aquela gente anda por ali para amanhar-se, que na classe política, também as qualificações não são as mais recomendáveis, e que não há muito mais, nem a fazer, nem a esperar. Grande parte das pessoas deixou de votar. E existe a ideia que tanto faz, seja quem ganhe os sufrágios, e venha a governar, não deixará de fazer o que sempre se tem feito, isto é, muito pouco, e mesmo assim, o que se faz, mais valia não ter sido feito.

Alguns, acreditam mesmo que se a justiça funcionasse em Portugal metade dos políticos estariam detrás das grades, como se pode perceber pelo sempre crescente número de casos de casos entregues aos tribunais de corrupção, abuso de poder, peculato, e outros crimes envolvendo figuras ligadas a governos e ao poder local, como a nomes grados da nossa praça.


Praticamente ninguém é declarado culpado, e quando o é, apanha penas leves ou de pena suspensa, sendo rara a figura do regime efectivamente aprisionada. Julgados e condenados, metidos nas prisões, só mesmo os que não tem meios para se defenderem, sendo mesmo, parece já, injusto saber que existe pessoas no cárcere, quando existe tanto criminoso à solta.

Neste “Kampus Libertatis” preocupa-me o povo incauto e pouco exigente, essa massa de gente, que corre levianamente atrás de figurões sem qualquer moral, e os deixa com um espírito mais de exploração que de missão arruinar vidas e sonhos. Preocupa-me um país que definha, sem rumo, sem saber o que de facto deseja para o seu futuro, enquanto as pessoas vêem cada dia, como num jogo de sorte ou azar, minguar os seus rendimentos e direitos, depois de uma vida de trabalho, e de tempos de luta e de esperança.

Preocupa-me a liberdade, a atitude, a palavra e o medo. As pessoas não saem à rua a protestar, não gritam a sua revolta, deixaram de gritar o seu descontentamento com a mesma facilidade com que deixaram de bailar, ou de cantar. O país, que dizem os cultos e os do regime, é uma democracia e um estado de direito, voltou a estar amordaçado, calado, oprimido. Tem-se de novo, medo de dizer, de apontar, de esboçar um protesto. Com o silêncio de uns, e o cobarde assentimento de muitos, se espera um lugar num qualquer instituto para um filho que acaba os estudos, a benevolência do presidente da câmara, o favor do dirigente da empresa pública.

A imprensa parece ter alinhado com a camarilha bem instalada do estado que lhe acaba por pagar os salários, através da publicidade oficial e a de pedido, sendo que, ao contrário do antigamente, nos tempos do fascismo, em que se lutava duro, mas contra algo que possuía uma existência inquinada em ilegalidade e imoralidade, e que, deste modo, recolhia uma aceitação generalizada, agora, lutar contra um algo proveniente de um estado de direito e democrático, mesmo que igualmente imoral e ilegal, suscitará, de imediato, uma reprovação geral.

Por isso é o silêncio. Dizer alguma coisa resulta invariavelmente em calúnia rapidamente silenciada. Condenada. Aqui a justiça corre. E no isolamento.

Por isso “Kampus Libertatis” é uma isolada várzea, sem préstimo, onde se encontram, às vezes, palavras que aparecem, sem que se saiba bem a sua razão, crendo mesmo, que muitas serão fruto de ventos e tempestades, de dias de sol, de ignorâncias e inquietações. De pensares, assim, simplórios já se vê. Quimeras. Serão tão simples as letras e palavras que por aqui apareçam, tão sem importância será este campo, longe das vedetas televisivas, e dos senhores da guerra e do tacho, que creio vou ter noites de sono, e dias de paz.

Este tem de ser forçosamente um campo livre. Pequeno ou simples, fraco ou pouco importante, mas liberto. Sem a condição de escravo. Com liberdade… essa, bem essa liberdade que é tão cara ao ser humano, nunca poderá ser negociada, porque ela é essencial ao homem.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

A crise vai de férias

Vamos de férias, partimos, estrada fora, fugindo à realidade de um quotidiano que nos esmaga. Apenas temos a vantagem perante os demais cidadãos desta Europa que deveria ser efectivamente nossa, e teima em parecer só de alguns, do costume. Que aqui dizem não ser fonte de direito, mas, bem vistas as coisas, tem um inimaginável peso.

Pelo costume morre o português. O outros choram e protestam uma crise a todos os títulos deplorável por geradora de perca de rendimento, de desemprego, de perda de qualidade de vida, de direitos, de ânimo e de bem estar. O nosso costume diz-nos que estamos iguais, como sempre, numa crise, igual a tantas outras que por aí batem, como ondas do mar varrendo a praia. Vai e volta, volta e vai, só é o cabo dos trabalhos se vai... e não volta.

O costume, bem nosso, diz-nos que nada é por demais preocupante, temos capacidade de defrontar uma série reiterada de crises, porque somos especialistas. Não as conseguimos vencer, juntámo-nos a elas. Precisamos delas para acordar de manhã. Para sairmos da cama. Para irmos trabalhar. Para seguirmos o nosso dia-a-dia, sem inquietações, pelo menos com o futuro, que também, já sabemos, pelo bendito costume, não será melhor que o dia de hoje.

Garantimos mesmo, não venha por aí o diabo, que nada mudará, queremos tudo igual Por isso temos uma justiça que leva um ror de anos para decidir coisa nehuma. A justiça fora de tempo dizem é injustiça. De tal modo, que em bom rigor, seria mesmo mais produtivo que nada fizesse, deixando o pequeno delito, para respeitar essa ideia de sermos todos iguais, afinal, como o grande crime ou o crime de gente grande, que a bem dizer, é o mesmo que nada fazer. Poupava-se tempo e possivelmente recursos, de todo o género. E não se criavam expectativas que desvirtuam um país já com quase um milénio de história.

Teimamos em manter-nos em crise apostando vigorosamente na manutenção, com aplauso e distinção, daqueles que nestes últimos anos tem diligenciado em nos desgovernar, garantindo assim, deste modo, uma resistência louvável dos portugueses ao mau viver, à vida sem esperança, ao caminho sem futuro.

Aplaudimos um ensino a necessitar urgentemente de reformas, de má qualidade, historicamente em crise, humilhando na praça pública os professores, facilitando sucessos por via administrativa, levando a cátedras pessoas que não sabem para elas quanto mais para ensinar, cuidando de colocar nas mesmas salas de aulas alunos necessitados de cuidados especiais com os demais, esquecendo a existência de discriminações positivas, e assim, agitando todos esses ingredientes se assegura a manutenção, por muitos mais anos, de uma desejável crise na educação.

Ele há crise em cada português, de tristeza, de sonho, de esperança. E de trabalho. Foi hábito que custou imenso, acabar com o amor ao trabalho, não é previsível agora assistir-se como antigamente, às lágrimas no canto do olho do trabalhador impossibilitado de prosseguir trabalho por ter alcançado os setenta anos de idade. Continuavam só por cunha e da grande. Hoje, respira-se aliviadamente no país, os trabalhadores estão, por fim, tão fartos e mortinhos da desordem e desorganização laboral, das rocambolescas avaliações por mérito, do reconhecimento da dedicação e esforço com recurso a suculentos prémios, do compadrio, que anseiam por reformar-se, por deixar de produzir, por nada fazer. O governo, e bem, para responder a tão agressivas irresponsabilidades e faltas de reconhecimento, castiga os trabalhadores aumentando a idade e dos anos de trabalho para se aposentarem. Assim, mostrando uma sábia sensibilidade, e uma astúcia sem limites, se garante por um lado um mundo que quer parecer que é, mas que não é nada assim, e se mantêm, a todo o custo, o costume, o que quer dizer, a crise.

Os portugueses deveriam ter acesso no Oportunidades do senhor engenheiro Sócrates ao cargo de doutores em crises. Barato, sem custos, recebendo com pompa e circunstância um Magalhães em cerimónia televisiva, e uns trocados de subsídio de frequência. Só precisando explorar o conhecimento prático praticamente ilimitado, de cada dia, e mais meia dúzia de teorias de trazer por casa. E seria ver os portugueses a explicar, mundo fora, como viver paulatinamente em crise. Como superar qualquer crise desde a económica, á financeira, á de valores, à pessoal, à de tudo e mais alguma coisa. Abrir-se-iam lugares para ensinar na Sorbonne e em Salamanca, e nos Estados Unidos. E mundo fora. Os portugueses transformavam-se nos salvadores do mundo, agilizando complexos expedientes que sempre se exigem para viver digna e tranquilamente em crise e evitando tanta desgraça que sempre decorre no ser humano sem preparação quando vive mal.

Tal capacidade que não pode deixar de se reconhecer aos portugueses, não pode afinal, ser reconhecida pelos executivos, que por costume, inviabilizam, tudo o que pode transformar esta gente laboriosa e sem futuro, em gente vaidosa, segura, espalhando bem estar por aí. Já se vê, era o fim do costume, o fim da crise, o fim de tudo bem português. E o que é português é bom.

Vamos de férias, pois bem há que ir e voltar. Iguais, nada de mudanças, não agitem um país que vegeta, um cantinho de terra semeada de gente, que preferivelmente nada faz, e com isso, assegura, ao mesmo isso nos valha, fazer asneira. O melhor é mesmo fazer como todos fazem, principalmente os que temos de respeitar e devemos tomar como exemplo, nada fazer, ou, se acaso nos der essa vontade indomável de trabalhar, Deus nos ajude, já sabemos da história, vem aí desgraça.

Bem, vamos de férias, desejando que não levem de cá essa crise que sempre nos baixou os juros das contas que nos asfixiam, que não nos levem a crise que garante empréstimos aos ricos e aos bancos, e com isso se finge apoiar e cuidar do Zé descalço, e que esta permaneça ainda algum tempo, é que, em bom rigor, se ela vai, volta a outra crise, a nossa, e não sei bem quem nos vai valer.

Vamos de férias.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Para quê acordar?...

Há dias em que não sabemos bem o que dizer, nem do mundo, nem da nossa terra, nem dos nossos próprios campos de olhar, do que vemos, ou queremos, ou mesmo, por fim, nem temos bem claro o que de nós próprios poderíamos ousar, se loucos, ou simplesmente ser, e dizer.

Baralhamos as palavras, do mesmo modo que sentimos atabalhoadamente dispersas as ideias, o que sentimos, o que dentro de nós vai corroendo, dilacerando, batendo um pouco por todo o lado, como se, de cada batidela, de cada abanão, algo inexplicável quisesse alertar-nos com um simples, “…cuidado, não vás por aí!”.

E em boa verdade vamos, seguimos sempre um ou outro desnorte mais ou menos intenso de acordo com a hora, o sentido do vento, e as ilusões que sempre tentam afogar-nos, bloqueando a clareza do olhar, turvando tudo, para que facilmente imaginemos uma coisa que não existe tornada, com um simples toque de magia, coisa nossa.

E pior que a ilusão de um momento, de um mau acordar, de mil sonos que se apoderaram da realidade tolhendo do que é, de facto, todo um mundo de sombras, é um acreditar teimoso, arrogante, acintoso mesmo, só mesmo um pouquinho menos que toda aquele arrazoado petulante do político no trágico momento que sempre compõe o seu mundo de enganar, prometendo delicias, e semeando tragédia.

Temos dias, em que duvidamos de tudo, começando por duvidar da nossa própria maneira de estar e de sentir, do que dizemos e queremos, de nós, e assim, de tudo. Do que amamos, dos sonhos que queremos repentinamente catapultados para uma realidade visível e tangível, das imagens que construímos quando pensamos, ali, num qualquer campo estranhamente longínquo e muitas vezes transparente, e mesmo na sequencia de olhares, que tentam apoderar-se de coisas, em cada instante. Em todas as direcções possíveis, mesmo as que conscientemente sabemos não existir. Dentro, ou mesmo, fora de nós.

Hoje acordei incrédulo… com os outros, e comigo mesmo. O tempo estava inconstante, pouco certo, não podendo garantir acalmia, estabilidade, podendo desviar-se, a todo o tempo, para manifestações pouco simpáticas de borrasca. O sol, que sentia furioso atrás das nuvens, pontapeava algumas, de modo que, depois de algum chuto mais certeiro, mais balanceado de energias, cuspia milhentos raiozinhos atrapalhados, que não chegavam nem a dar calor nem luz, mas a prometer protestos e agitação.

Ainda não consegui libertar-me dessa interessantíssima actividade, que muitos crêem libertadora e responsável, heróica mesmo, de sair a trabalhar, o que para alguns é um esforço, ou parte dele, para, de modo honrado tentar libertar-me de uma inaceitável pobreza para contribuir serena e paulatinamente no engrandecimento de uns poucos e no crescimento da comodidade e bem estar de outros.

E assim, entre umas nuvens salpicando aquilo que às vezes percepcionamos como sendo um universo libertador cheio de anjinhos aos pulos e almas em rodopio, e uma estrada de negro vestida que nos embala, quilómetro a quilómetro, curva a curva, até despertarmos, um pouco ébrios, para isso do trabalho. Que nos faz acordar, e nos faz sentir escravos um pouquinho, tendo de sorridentes, fazer de peças de todo um aparelho mecânico, cheio de dentes, que engrenam em outros, e assim, abocanhados, e triturados entre essas massas esbranquiçadas que são as dentuças do labor, vamos perdendo um pouco da liberdade, e dispersando vaidades a cada dentada, a cada parte de nós que vai, saltando, entre actos, factos, fazeres, e afazeres sem fim.

Salva-nos acreditarmos na relatividade, uma estranha invenção ao serviço dos galácticos que mandam nas pessoas, da terra e de outros planetas – percebeu cedo a economia que atropelar resulta mais se um concentrado insuspeito estender as garras e trucidar mesmo o que longe, já parece ser de outros, mas ainda é, e tem de ser, convêm, só nosso – e que proclama, sazonalmente, como se de uma montanha russa se tratasse, uma amálgama intempestiva de direitos, da pessoa, e do trabalho.

E a relatividade, que nos garante girar desordenadamente o tempo se esquecermos o mundo das outras coisas enquanto corajosamente nos empenhamos em produzir, embriaga-nos, nessa ideia que quanto mais fizermos ao patronato ávido e pouco ligado a essas mariquices de humanidades, mais depressa chega o fim de semana, e depois de uns poucos, voltarão as férias, e a ociosidade será recompensa, imaginando não fazer, algo, para alegremente se fingir que se fazem outras coisas que curiosamente, deveriam corresponder como contrapartida a um ano de dar muito de nós a muito poucos.

Infelizmente, acabamos por raramente fazer aquilo que levamos um ano inteirinho desejando concretizar e que nos parece merecido. E acabamos por voltar, ordeiros, alegrotes, simpáticos, ao lugar do crime, onde de sorriso nos lábios tentamos fazer crer que gozámos imenso, e para o provar, deitamo-nos a novas tarefas como se tivéssemos aglomerado em algum canto do nosso interior uma carrada de energia sem fim.

Hoje acordei sem entusiasmo. Dizia um filósofo de casa de pasto, entre um copo de três e um amontoado de arrotos sabichões – desses saídos dos inúmeros e complexos exercícios de bem se mostrar adquiridos através das novas oportunidades – , que era impossível fazer mexer, ao contrário do que aos burros sucede, um humano desprovido de ânimo. E dizia ainda o pobre arruinado de haveres e de saúde, mas de copo erguido, avermelhado, na mão trémula, que o mal do país, residia aí, aí e só nesse dilema, na falta de entusiasmo. E, filosoficamente avançava argumentando ininteligíveis balelas, profundos raciocínios húmidos de tinto, mas sustentando, na sua essência, como se poderia avançar num pobre país onde as pessoas viviam tristes, sem esperança, ensonadas, numa letargia imensa, que só alguns eruditos da psicologia humana, aventavam tratar-se de um processo inconsciente de afugentar todos e tantos infortúnios de todos os lados fustigavam os portugueses.

Ignorância e entusiasmo, em medidas rigorosamente contrárias. Uma ignorância que podia transportar-nos a dar meia dúzia de voltas ao mundo, e um entusiasmo que nos tolhia o passo de tal modo, que só o facto de levantar em cada manhã, parecia heresia. E tudo isto ocorria enquanto uns engraçados foliões fingiam dirigir o povo, recorrendo a divertidas iniciativas, a tecnocráticas medidas, a cuidadas decisões, e a planos normalmente efectuados apenas com o objectivo de não importunarem, sendo esquecidos, mesmo antes de feitos. Em boa verdade, a classe política engordava com a letargia, com a falta de entusiasmo, com a falta de exigência. Mesmo que para algumas coisas revelassem algum espírito mais empreendedor, algum animo mais feroz, alguma vontade mais visível. Pena só que tanta vitalidade, e nisso se pareciam com o povo que os mantinha, como bem deveria ser – ou não existiria democracia – não servisse para coisa nenhuma.

Com a falta de entusiasmo definha o país, as pessoas perdem o sorriso nos rostos, a esperança e o sonho deixam de alimentar mentes que deveriam crer num dia melhor, num amanhã, nem que ilusão, nem que fosse apenas possível para meia dúzia e numa qualquer outra terra. O mundo gira, os portugueses vão andando, acordam e saem de casa sem lavar os olhos, sem ver. Como manda a prudência, é melhor nem olhar, e muito menos ver. Muitos já nem querem saber dessa patranha da democracia, do estado de direito, ou mesmo da partidocracia que parece instalar-se no poder. É tudo conversa de meia dúzia de compadres que se amanham com qualquer cor, e com qualquer fato. À conta do freguês pouco esclarecido e nada exigente. Endorminhado. Nem se esconde a corrupção, nem a corrida ao pouco que temos por parte de meia dúzia de chicos espertos que se agarram ao poder ou a quem nele se instala. É um vale tudo, mesmo que se tire um ou outro olho a algum distraído ou que se atreva a meter-se nos negócios alheios, torna-se lícito, desde que se saiba fazê-lo. Alguns recomendam-no mesmo, a prática do pouco recomendável como modo de impressionar a vizinhança e mostrar sucesso na vida obra com a facilidade do aumento do património.

Com a justiça que está ao serviço das gentes, mais de uns que de outros, claro está, dizem que é sempre assim (o contrário é ficção que sempre aparece nos filmes para enganar as massas) a maioria de se cuide que uma minoria conhecida joga em casa. Já se conhece muito antes o resultado de intermináveis jogos onde se gasta tempo e dinheiro, para não se chegar a coisa nenhuma. Ninguém quer. Nem o estado, que sobrevive facilmente no meio de toda esta trampa, e que procura passar despercebido entre as trapalhadas de gente grada, colunável nas revistas mais rosinhas, que sempre parece estar à beira do cárcere e subtilmente, como nas aventuras mais arrojadas, escapa sempre por uma insignificante nesga, nem o povo que adora espectáculos e suspira a qualquer acto mais intimista, nem os actores. Ninguém quer nada, nem decisões justas, nem intervenções temerárias, siga o baile, e que no alto se conservem os marqueses do amanho, a ralé de olhos no telejornal em hora de ponta, e que o estado vá garantindo, quanto mais não seja, umas boas lutas que tanto podem ser com professores como médicos ou magistrados. É preciso é sangue… espectáculo, toirada e arenas, imensas espalhadas por aí…

Hoje acordei, quando em bom rigor deveria ter feito um manguito a isto de trabalhar faz bem, e deveria ter permanecido deitado, olhos bem fechados, cérebro desligado… a ressonar sem qualquer controlo de decibéis. Deveria ter mandado às malvas os usos e bons costumes deste país e deveria ter preguiçado, tranquilo – quem não deve não teme – à espera de melhores dias.

Hoje, para meu desespero, nada me ajuda a esquecer o meu sonho doirado, perdido nas lonjuras imensas de outros mundos para lá, num céu azulinho e cheio de magia, onde a minha princesita, uma meia mistura de mulher e anjo, com um toque de sereia, outro de diabo, e mais uns poucos, difusos, ténues, relembrando musas, deusas e outras cosisitas lindas, mas afigurando existir em boa e rija carne e osso, e prometendo doces ternuras e infindáveis delícias, se afasta, irremediavelmente de mim. Porque se cansou de permanecer longe, tipo bela adormecida e de eu, não saltar cheio de destreza para cima do meu cavalo alado, e prego a fundo, percorrer mares, e céus, saltar pelas nuvens e patinar entre estrelas, me arrojando a seus pés, como um vulgar príncipe encantado, curvando-me ao seu colo, procurando nela uma das faces, ou os lábios, para o beijo miraculoso.

Acordei raivoso, perigosamente humano, e senti-me português, nesta minha raiva interior de ver que nada sou, e que, como se estivera num qualquer folhetim de terceira ordem, observando um caminhar cada vez mais escuro, um mundo cada vez mais amargo, o fim da alegria, mata e esfola a torto e a direito. Portugal coitado não tem culpa nenhuma de ser um ponto de convergência da mais incompetente gentalha que se pavoneia como a cigarra, vaidosa, numa vastíssima veste, sem limites, gigantesca, sem cor, nem brilho, transparente, que revela o que é, o que tem, uma nudez sem fim, que mostra um traseiro volumoso com falta de passagem de higiénico papelucho, e uma mente minúscula desprovida de senso ou de algo que mostre valia.

Hoje, percebi ao acordar que cada vez estou mais só. Como se tivera perdido todos os anéis e os dedos ressequidos não fossem capazes, per si, de atrair uma mão amiga, um abraço. Tive de descarregar todas as minhas mágoas e a revolta que trago dizendo cobras e lagartas de tudo o que conhecia e mesmo, confesso, de tanta coisa que não está acessível às minhas capacidades. Ataquei a justiça… só um louco ataca esse pilar dos estados modernos, da civilização, da cultura e sabedoria humana. Devo fazer mea culpa, e deveria penitenciar-me com uma quarentena em lugar escuro, e de onde, gritasse o que quisesse, não fosse possível a nenhum ser vivo, ouvir-me. Ataquei a governação, como se essa gente boa, que com espírito abnegado, e de sacrifício mesmo, prejudica os seus interesses e dos seus para, em troca de pouco, servir a causa pública. Ataquei meia dúzia de seres, que imaginei praticando ilícitos actos, como se nessa gente dada às ciências das economias e da produção da riqueza e do bem estar fosse possível atribuir semelhantes acusações, quando, se pode observar, vivem para os outros, para a governação das pequenas bases da nação, as famílias, produzindo salários, que às vezes se pagam, e trabalho que muitos esquecem executar. Ataquei, o povo, o pobre povo, coitadito, enganado à esquerda e à direita, por detrás e pela frente, cada vez pior, sem caminho para percorrer, sem heróis, sem sonhos. Seguindo obedientes o vizinho rico da casa amarela da rua da frente, o deputado do círculo que ainda tem muito que percorrer para pagar as promessas que fazia porta a porta, o partido respeitável da borboleta com o rato do computador, o clube da bola, o banco do jardim onde os reformados jogam à sueca e esquecem assim as contas na farmácia. O povo…

Hoje acordei quando deveria ter ficado na cama, olhos fechados… silencioso, escondido, não existindo. Ganharia o país, o pessoal lá da fábrica, o presidente da Câmara Municipal, e eu próprio, que não teria de gramar, horas e mais horas a ouvir toda esta peçonha que trago dentro de mim. Hoje, e por culpa do meu cavalo alado, que teima numa enxaqueca que lhe apanha os membros anteriores e inibe a rotação das orelhas, não é possível ver-me como pessoa, como gente, como povo. Possivelmente nem tenho já, essa possibilidade, sempre compensadora, de dizer mal dos políticos, do governo, dos padres, e da gente ratoneira que anda por aí, a tirar cursos subsidiados, de como enganar meio mundo. Nem posso estar com o meu amor, aquela princesa do outro lado do mundo que me faz suspirar e que desejo mais que a própria vida.

Hoje, aqui me sentindo só, sem vontade de ser, ou de estar, ou de coisa nenhuma, sem poder amar, ou dizer que amo, ou olhar a coisa que desejo, sinto mil fúrias em ter sido louco, e ter acordado, e ter saído da cama e de casa. Fui louco, abrindo os olhos para um mundo completamente perdido, e sem rumo, quando simplesmente poderia manter-me adormecido, desligado de coisas e loisas. Fui simplório quando percebendo o perigo de viver uma vida assim, desafiei mil perigos e saí de casa, podendo a todo o momento ser vítima de carjeking ou de malfeitores, ou simplesmente ser apanhado por alguma gripe vinda de um animal menor. Fui irresponsável quando me propus a trabalhar, quando isso é um verdadeiro atentado, num país onde gente séria e importante acumula reformas, e só trabalha, diz-se baixinho, para arranjar umas poucas mais. Agora, quem de facto trabalha, dizem com despeito os acumuladores de pensões, não pode reformar-se novo, que pode desequilibrar as contas públicas.

Pobre mundo, pobre país, pobre gente… hoje acordei, levantei-me da cama e fui trabalhar. Porquê?