quinta-feira, 13 de outubro de 2016

PERDOAR OU NÃO PERDOAR, EIS A QUESTÃO E O SEU ESTUDO















 O mundo está a viver uma profundíssima crise. Depois de milhões de anos envoltos em muitas interrogações, podemos dizer que com o aparecimento da História (e nesse âmbito a Pré-História) começa a conhecer-se as vidas dos homens, dos grupos, das sociedades, dos países e das nações. E podemos testemunhar de um modo quase inquestionável que o caminho do homem desde que é conhecido até ao século passado foi pautado por uma evolução, com ritmos e intensidades diferenciadas, mas que sempre se verificou. Alguns historiadores ou homens das ciências falam em épocas de crise, como a Idade Média, ou em barreiras que obstaculizariam o desenvolvimento do conhecimento e seu impacto na natureza e vida humana, mas em bom rigor, a força das ideias, o constante melhoramento, a verdade, não nos permitem dizer que em algum momento o movimento em progresso das sociedades humanas, sobretudo ocidentais, e dos mundos conhecidos, possam ter alguma ver retrocedido, ou parado.

No conhecimento, nas ciência e nas técnicas, nos utensílios, nos melhoramentos introduzidos na qualidade de vida dos povos, houve um movimento parecido com o da queda de um peso, com a tendência a acelerar, sempre mais e cada vez mais, de modo que as transformações foram-se verificando sempre no homem, no seu meio, nas suas actividades, na maneira como fazia a guerra, com as descobertas de novos mundos, e pode-se defender que esse movimento não mais parou e tornou-se vertiginoso a partir do século XIX e atingiu o seu ponto mais alto no terceiro quartel do século XX.

Antes de terminar o século XX parecia que o homem acabava de efectuar as mais audaciosas conquistas e que os problemas, imensos que atormentavam o mundo e os homens seriam resolvidos naturalmente com os novos meios que detinha, e os conhecimentos cada vez mais profundos. Parecia que um mundo impregnado de violência com o temor de guerras e a ameaça sobre as nossas cabeças de uma guerra terminal com as poderosas armas atómicas havia terminado e uma nova ordem mundial que se apresentava iria  garantir tempos de paz, que se alargariam a todo o planeta.

O conhecimento científico-técnico tivera um desenvolvimento avassalador que se torna fastidioso enumerar aqui, mas deixamos como exemplo as novas tecnologias e a sua aplicação em inúmeros sectores da produção, desde os automóveis, às ciências médicas, às comunicações, garantiam que o homem do futuro iria conquistar uma qualidade de vida em conformidade com tudo aquilo que os novos saberes introduziam na vida do homem, podia mesmo pensar-se o o homem do futuro poderia ocupar-se mais do seu corpo, do seu espírito, dos seus tempos livres, e o período que dedicaria trabalhando à sociedade não só teria uma penosidade insignificante como seria de muito menor duração. E problemas como os focos de pobreza um pouco dispersos em algumas regiões do mundo acabariam com o milagre da globalização que foi criada justamente para que os países mais pobres se aproximassem paulatinamente dos mais ricos, e também se apostava que a desigualdade na distribuição da riqueza se tornaria menor, criando um mundo mais justo, mais fraterno e solidário.

Estamos em 2016, século XXI, e percebemos que todo esse desenvolvimento, que toda essa promessa de bem estar, que as proféticas mudanças que se adivinhavam na vida dos homens, que o melhoramento da economia dos países pobres e sua aproximação dos mais ricos, que a paz e o fim das guerras, que as novas ciências, afinal nos trouxeram para um beco sem saída sem precedentes e existe uma crise generalizada que ninguém, em bom rigor, sabe como e quando vai terminar. Se terminar.

Hoje o homem confronta-se com a maior crise de todos os tempos. Pois toca em tudo. Tudo está em causa. E curiosamente contra a rotina do decurso da vida do homem, já começámos a retroceder. O mundo parou, está parado, é uma ilusão de óptica ou um erro de paralaxe dizer que se move. Em bom rigor o mundo já deu sinais de estar a colapsar, de ter tido más opções, de ser governado por gente medíocre à sombra de democracias muito imperfeitas em que as pessoas na maior parte dos casos são simplesmente enganadas e bombardeadas de mentiras. Os direitos de trabalho tendem a perder-se, e a justificação parece contradizer o que se esperava do mundo novo, em favor da produtividade. Então o que fez toda a nova tecnologia se o homem ainda trabalha em más condições e pretendem que trabalhe mais, e mais anos? Fala-se numa famigerada deslocalização que veio pôr do avesso muito do que era estabilidade e segurança. Mas não se explica que essa deslocalização é filha de uma globalização, que além de explorar países em que não se exigem condições de trabalho e se explora assim a dignidade humana e a mão de obra barata, ainda faliu quando ao invés daquilo para que foi concebida o fosso entre os mais ricos e os mais pobres aumentou, e nos homens o mesmo fenómeno se verifica, sendo que a muito poucos, e que em boa verdade são desconhecidos, cabe o quase todo que rende um mundo em labuta. O dinheiro simplesmente parece ter desaparecido. Ninguém tem, tudo está falido ou em vias de lá chegar, e os próprios Bancos que era o local onde as pessoas normais julgavam estar o dinheiro caem na falência e não têm dinheiro e muitas vezes vivem do absurdo de serem subsidiados por aqueles que depois continuam a explorar. E, vamos um pouco mais longe neste calvário, falemos dos governos, daqueles que são responsáveis, ou pensamos nós que são os responsáveis pelo destino da orientação e governação das nações; quem governa? os governos ou grupos, interesses e corporações que estão por detrás? Quem governa Portugal? Será o governo que é leito pelos portugueses ou é a União Europeia? Ou o Banco Europeu? Ou o Euro Grupo? Ou a Alemanha através da sua Chanceler? Ninguém sabe, mas tudo parece... A chanceler alemã foi eleita democraticamente para andar de país para país na União Europeia a dar palpites? Mas essa senhora delicada ignora ou esqueceu que o seu país levantou-se à custa da solidariedade de outros povos e sem ter sido encarregada de nada, em termos de legitimidade democrática já parece mandar na Europa toda. E o Parlamento Europeu? Para que serve? O que faz? Legisla? A legislação europeia é debatida e feita no tradicional poder legislativo ou aquilo é uma gaiola dourada para políticos que precisam de proteger as suas reformas? Que solidariedade existe na crise europeia quando a Grécia está a ser esbulhada de tudo, e depois de lhes tirarem o que puderam e o que não deviam, ainda deve mais. Qual é o futuro do povo grego? E de Portugal? E dos portugueses? Ano após ano sem perdem salários, poder de compra, se reduzem pensões, não há investimento, cada vez se pagam mais impostos, e a bem do cumprimento do défice e de outras lérias, os portugueses estão rigorosamente e visivelmente a andar para trás. Cada vez se vive pior. Cada vez as famílias e as empresas estão mais endividadas. Cada vez há mais desempregados e mais jovens a abandonar a terra pátria à procura como no passado de um futuro mais digno. Finalizaria perguntando, depois de tanta conversa dos nossos políticos, de tanta discussão no parlamento, de tantos sacrifícios impostos aos portugueses, que segundo um bem podem dormir debaixo da ponto e segundo outro são piegas, o país deve menos? Alguém sério pode avançar com uma ideia de quantos anos ainda vamos estar vergados a sacrifícios, mentiras e pobreza? Alguém sério, pode até nem ser economista, pode avançar com uma estimativa em anos para pagar o que devemos? De facto a crise não é mundial, é de todos e de cada um. Tem nome. É Europeia numa União Europeia decadente e de duvidosa legitimidade democrática na determinação dos que a representam. É portuguesa, pois o nosso país vive anquilosado há mais de uma década e entre todo este espaço de tempo ,se ouviram da parte de quem nos governa realizações responsáveis, e fecundas. Mas tudo está na mesma, na zona vermelha, e não existe esperança em sair dela nem os economistas descobriram ainda melhor arma para combater a falta de dinheiro que o ir buscar aos bolsos dos que trabalham. Ora bolas, isso há mais de 500 anos já faziam os nossos reis quando precisavam de dinheiro. Se a economia é isso, não é ciência nova, é uma coisa bem antiga que funciona a olho. Por estimativa. E pode ser que dê. As novas ciências faliram.

E cada um de nós também faliu. Esquecida a moral que era o que determinava que cada um tivesse a possibilidade de escolher bem, e sem necessidade de ser observado, pois obedecia a uma educação em que eram esculpidos valores que se seguem pela vida fora, de modo a não causar danos e pelo contrário estar com os outros. Rejeitada a ética que num colectivo é um conjunto assumido por todos de procedimentos que seguidos fazem com que a vida se leve sem atropelos e no respeito dos demais, de tal modo que observada evitaria muitos prejuízos em muitos para um bem de um que transgride. E depois são as leis e a justiça, que sempre temos, e em boa verdade até funciona em alguns. Pena é que se não estenda a todos. A Constituição garante que todos são iguais perante a lei. Mas não pode garantir que a lei é igual perante todos. E basta visitarmos as prisões para percebermos a realidade portuguesa. Uns conseguem fugir-lhe, tudo contribui e aquele que era acusado de repente vê-se cidadão exemplar pois simplesmente o seu processo prescreveu. Outros têm advogados pagos a preço de ouro e andam a jogar ao apanha ou às escondidas com a Justiça e as pessoas acabam por nem sequer perceber o que raio é tudo os que as televisões mostram e as prisões esperam. Outros agarram-se a poderes, existem muitos poderes organizados, corporativos, políticos, religiosos, ocultos, e então é tudo deles que a lei não lhes mete medo nem se lhes aplica. E então muitos fracos de espírito para propagandear o seu poder maltratam e machucam os indefesos, os mais débeis, os mais pobres. E a impunidade vê-se, não anda escondida, não se disfarça, é acintosa, provocadora. E muitos que detêm o poder ainda o usam como se estivéssemos na Idade Média e se tratassem de marqueses ou condes, a quem tudo era legítimo no seu território. Falta muito na nossa democracia. Além de não ter amadurecido o suficiente é uma democracia que não abre portas às representações e instituições públicas, em que a sociedade civil só é falada para recolha de votos, é uma democracia feita para os políticos mais que para os cidadãos, mais para as organizações estatais que para quem delas se serve. É um estado de direito aonde ainda não houve a humildade de acabar com um direito, o administrativo, que apenas serve, para que se perceba que de direito nada tem pois nasceu torto e torto continuará enquanto for um direito criado pelo estado para julgar especificamente causas onde ele é réu. Isso é uma aparência, não é nem justiça, nem direito, nem verdade. Gostava de dizer que este país tem potencial, e tem, que tem bonitas praias e lugares cheios de magia que deliciam quem nos visita, mas isso não chega. Este povo merecia muito mais. Mas a crise responde por tudo.

E por fim chegamos à questão de perdoar ou não. E não é fácil decidir estando seguro de que essa é a forma de resolver um conflito, sem que não se ocorra o risco de uns tempos adiante sermos confrontados com o arrependimento pela decisão escolhida. Numa perspectiva humanista embebida na moral judaico-cristã, não haveria que ter qualquer dúvida o caminho é o amor e o perdão. Então perdoar seria a decisão certa. Prevalecia o amor, o bem, a vontade de criar condições para uma melhor convivência. Seria desejável, e mostraria uma grandeza de espírito assaz assinalável. Mas a vida do homem torna-se angustiosa justamente na hora de escolher e levamos as nossas vidas em sucessivas escolhas que nos podem levar ou não a uma vida feliz e em que uma má escolha pode afectar a nossa existência e o nosso futuro. Existem sempre alternativas, sempre outras hipóteses, outros caminhos, como não errar, como ter a certeza da escolha que temos de fazer. Com o acto de perdoar é exactamente o que sucede. O perdão pode ser a decisão certa. Mas o perdão por si não irá ao contrário do que se deseja alimentar mais comportamento indignos que vão provocar prejuízos noutras pessoas, que vão as espezinhar, atropelar na sua dignidade. E se perdoar pode tornar-se um incentivo a manter procedimentos que de uma só vez violam leis, éticas e moralidades e apequenam e ultrajam o ser humano, o acto de perdoar não pode ser uma simples decisão pessoal, individual, pensada só em favor de um mas possibilitando que daí decorra, com muitas probabilidades, a desconfiança em quem exerce uma autoridade e se serve dela para brincar e destruir vidas alheias.

Por mim, perdoaria. Não tenho qualquer dúvida. Mas pelo passado, não sei nem imagino quantas pessoas foram tragadas pela voragem imoral destes seres, ou pelo futuro, não imagino nem tenho ideia de quantas vezes mais podem repetir estas baixeza, estas ilegalidades, este mal, não posso de modo algum perdoar. Estaria a beneficiar o mal desprotegendo e abrindo caminho para que o bem fosse atacado, para que os mais fracos, os doentes, os mais débeis fossem prejudicados por uma decisão minha. Não poderia me perdoar a mim também. Nunca.







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