segunda-feira, 25 de abril de 2016

A LIBERDADE JÁ PASSOU POR PORTALEGRE?


25 de Abril sempre. Realidade ou ficção?

A liberdade já passou em Portalegre?




Apesar de nunca me ter considerado um homem de esquerda, dificilmente admito que exista gente que mais defenda a Revolução dos Cravos, em 25 de Abril de 1974, do que eu. Não reconheço nem à esquerda nem à direita, o direito a qualquer monopólio, muito menos quando se trata de valores de uma importância extraordinária em que o ser humano ocupa o lugar central. Conheci esquerdistas que só coçam para dentro, isto é, falavam maravilhosamente bem e muito na defesa de valores que seriam do povo e ao mesmo tempo iam arrecadando benefício próprio. Da maneira igual que conheci pessoas que se diziam de direita mas respeitavam e defendiam valores como a dignidade humana, a liberdade e a democracia.

Hoje ainda existe gentalha com saudades do tempo do trabalho de sol a sol e sem quaisquer direitos. E, graças a Deus, mesmo na direita existe quem não suporte sequer a ideia de voltar atrás.

Essa rotulação das pessoas em esquerda ou direita, ou em vermelhas ou azuis, ou do centro, do alto e do baixo não me caiem bem. Acho isso um simplório e demagogo ajuntamento de pastorícia, como se um humano, em todo o seu esplendor, fosse separar o gado pela cor do pelo. Feio, Nada criativo. Acho que é mais bonito todos terem a cor que desejam ter, querendo, e misturar-se cada cor com as demais, o que acabará por reproduzir um colorido mais alegre e um tipo de semelhança entre todos.

Essa cantiga de sermos todos iguais também não chega a penetrar nos meus ouvidos, é uma léria pegada, sem qualquer fundamento, e recordo aqui que Fernando Pessoa um dos maiores vultos das letras portuguesas escrevia no seu livro "O banqueiro anarquista", como podem ser as pessoas iguais se logo no nascimento existem diferenças?

E nem sempre, numa perspectiva puramente jurídica o ser igual é garantia de justiça. O que defende o direito é que para se encontrar justiça deve existir de facto igualdade, mas apenas entre iguais, sendo que deve ser diferente o caminho se analisarmos entre desiguais, onde acaba se justificando o tratamento desigual.

Bem, ultrapassados estes preâmbulos - gosto que quem me lê perceba com que tipo de loucura se confronta - posso ir ao essencial, que neste dia de 25 de Abril, necessariamente é a LIBERDADE, A REVOLUÇÃO DOS CRAVOS, A DERROTA DA DITADURA, A CHEGADA DA DEMOCRACIA, E A APROXIMAÇÃO DE PORTUGAL AOS PAÍSES CIVILIZADOS.


Vou deixar uma nota, eu, enquanto pessoa, e de imediato com a Revolução e as consequências dela, perdi mais que ganhei. Mas quero dizer, eu era um jovem de 18 anos, vivia tranquilo sem me preocupar com absolutamente nada que fosse demasiado sério, senti na pele, e anos depois fui sentindo que a minha antiga solidez tinha sido abalada, que estava desprotegido, e só. Anos depois percebi, que apesar de tudo, nada do que eu perdi podia ter mais valia que a Liberdade que foi dada a um povo oprimido, que o sonho nascido em tanta gente de melhores dias, adquirir direitos de gente, sociais e do trabalho, enfim, ser pessoa em plenitude.

Defendo que a dignidade humana, a liberdade, a justiça e tantos dos valores que Abril trouxe aos portugueses não podem ser negociados. Da direita onde eu julgava pertencer, fui com a maturidade me deslocando à esquerda, e cheguei ao centro, e em muitos momentos me coloquei mesmo do lado dos movimentos de esquerda e da intervenção sindical. Fui sindicalista, não por desporto, não porque não queria trabalhar, não porque era um eleito e o meu partido me colocava ali o resto da vida onde me transformaria numa espécie de patrão de trabalhadores. Fui sindicalista pois entendi que por detrás da Bandeira de um Sindicato poderia ter mais força e mais apoio na luta que desde cedo me opusera à tirania dos que não respeitam as leis, e atacam os indefesos.

Cheguei a Portalegre em 1977. Primeiro, por pertencer sem qualquer tipo de vergonha à direita (devido fundamentalmente a princípios e valores oriundos da educação que recebi e da moral cristã), e não sendo rico, fui um osso duro de roer para os esquerdistas que achavam que eu possuía um tipo de lepra, e assim, deveria ser banido. Era alvo de ataques e não tinha ajuda na defensiva. Mas ia resistindo. depois apercebi-me que Portalegre nem era de esquerda, nem de direita, e muito menos do centro. Portalegre era uma amálgama complexa onde tudo se misturava, as extremas, os centros, os lados, as alturas e as castas, com todo o séquito de parentes e amigos, compadres e gente bem, e pessoas que nem gente seriam. Fiquei atordoado, não é fácil vir de fora, e cair nesta Babilónia, encontrar o norte e seguir o rumo desejado. Depois já não era só as esquerdas a querer tirar confrontos comigo. Hoje aparecia um cobarde poderoso (assim costumam ser os que se julgam fortes e procuram a glória carpindo nos pequenos. Acho que até a Igreja, que tinha como Instituição acima de qualquer dúvida, me tentou rasteirar. Percebi que Portalegre era um lodaçal. Foi quando continuei a lutar, nunca desisti nem fugir de quem quer que fosse com medo. Foi quando percebi de um modo claro que o mal existia em todo o lado, tal e qual como o bem. Catalogar grupos ou pessoas não é rigoroso. Vi pessoas de direita e de esquerda asquerosos, prepotentes, danados para assaltarem tudo o que lhes fosse diferente. E encontrei pessoas dos mesmos lados que me mereceram respeito e admiração. No Sindicalismo procurei dar robustez à minha capacidade de refilar e lutar contra a opressão, e defender gente humilhada e mais fraca. Fi-lo, alarguei-me um pouco mais e defrontei um poderoso tirano em campo, aberto, meteu justiça, meteu tribunal e juízes, ganhei três meses de prisão e o sujeito que atropelava leis e pessoas viu o processo dele arquivado. É verdade que nem todos os juízes podem ver bem. Perdi a fé na Justiça. E percebi que os poderosos podiam, tocando os burrinhos certos, tirar a razão a quem a tem, e fazer calar quem justamente reclama. Depois, por ser de direita para uns (era simpatizante de um partido de direita, e nunca o escondi) e de esquerda para outros (pertencia a um sindicato vermelho) comecei a levar cacetada de todo o lado. E sempre me fui defendendo. Levei porrada até poder, confesso, mas sou resistente, e sempre que pude respondi de jeito igual. E, depois de diplomaticamente ser convidado a sair do movimento sindical, continuei a saga de lutar pelos valores de sempre. E enquanto estiver em Portalegre - podem expulsar-me para a Bósnia ou a Síria sei lá - continuarei a lutar, a dizer não, a ajudar quem possa, e a defender-me dos cobardes que continuam a tentar me derrubar. Enquanto vir elites que mandam na cidade, que colocam familiares, amigos, filhos, namoradas, companheiros de partido, cunhas de gente poderosa, nos melhores lugares da Administração Pública, sejam ou não aptos ou inaptos, tenham mérito ou demérito, eu não posso calar. A liberdade, a democracia, os valores de Abril, não podem estar implantados como verdura numa horta, fava aqui, alfaces ali, cebolas acolá, feijão verde mais acima, O que a Revolução de Abril trouxe foi uma vitória incontestada no que respeita a valores humanos, vitória essa que deve constitucionalmente ocupar todo o território nacional, não podendo nunca ser cerceada neste quintal do senhor X, nas ruelas do doutor Y, e em cantos e lugarejos um pouco por todo o lado. Olho para Portalegre, que foi cidade de meus avós e de minha mãe, e que eu conheço faz 60 anos. E tenho mágoa quando reconheço ser aqui um estrangeiro. Foi o preço de não me ter agrupado a nenhum núcleo, mas procurar ser um pouco de toda a gente. Não sou de ninguém. Qualquer poder nunca está do meu lado, pois tem seus sequazes para saciar, e junto os do grupo, os do poder, os compadres. Muda o poder, perdoem-me os puritanos, só mudam as moscas. Para quem não se vendeu, nem é poderoso, nem primo, nem filho, o melhor caminho, como muitos portalegrenses tiveram de fazer, é sair correndo para Lisboa, ou tendo lá estudado e sendo bom, por lá ficar. Hoje, Portalegre é a pior cidade capital de distrito do país. E não fora o centralismo da Administração Pública e de Serviços vários, estaria reduzida ao tamanho de Nisa ou de Campo Maior. Confesso que não conheço elixir que possa dar uma volta no declínio. Eu penso, mas não sou académico, nem intelectual, nem tenho títulos nem dinheiro para dar sentenças. Mas, nas minhas meditações, num dia de 25 de Abril, pergunto a mim mesmo:

- Será que a LIBERDADE já passou por aqui?


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