quinta-feira, 21 de maio de 2020

COVID-19: CONTINUA O MILAGRE PORTUGUÊS, MAS É PRIVADO



















O milagre é Portugal.

Não temos um milagre mas a multiplicação dos milagres. A multiplicação dos pães por Jesus Cristo fica muito aquém da sucessão sucessiva de milagres que proliferam em Portugal.

Nacionais e estrangeiros e gente grada como Trump e Boris, ou como os governos pelo mundo fora olham admirados e certamente invejosos para o sucesso do milagre que não pára, e nem foi preciso o 13 de Maio - que a Igreja já não vai a todas - nem a Nossa Senhora de Fátima: Portugal deu novos mundos ao mundo, e desta vez em matéria de saúde, controle de pandemias, gestão de recursos humanos e de equipamentos e materiais.

A pandemia veio brava e matou que se fartou em Espanha e na Itália mas meteu travões às quatro rodas ao passar a lusa fronteira. Aqui, de pá na mão estava a sombra da famosa padeira, a temível Brites que matou sete espanhóis, diz a história, e os assou no formo em Aljubarrota. Aqui, estavam os exércitos preparados, equipados, treinados e emboscados de tal modo que a operação COVID-19, nas palavras do presidente da república foi um milagre.

Grandes intervenções da ministra da saúde e da senhora directora geral todos os dias. E, com a ajuda do precioso segredo estatístico, e não fora alguns erros administrativos sem importância, poder-se-ia dizer que a tempestade vinha brava, mas borrou-se toda quando viu os braços de trabalho portugueses e saltou, vibrante e fulminante por cima dos céus rumo às américas onde mata sem olhar a quem. Não foi exactamente assim, mas andou perto.

Tão perto que assistimos agora a um rodopio em que todos deram as mãos, o governo, a oposição, o presidente da república, o primeiro-ministro, e o zé povinho. Agora, tiram fotos e aparecem nas redes sociais pelo mundo fora a mostrar o milagre ao vivo, o povo pode sair, o povo pode e deve correr às ruas, sair a fazer compras, almoçar fora, beber cafés, o povo pode tudo... 

O povo não poderia mas já pode ir na praia, amanhã será no bar, e depois virá a discotoca (Toda a gente sabe que os discos não tecam, simplesmente, tocam).

Portugal milagroso aí está. 

O milagre português deu-se. Deus é português.

E, se precisamos de uma informação na Segurança Social não podemos entrar nela, temos de marcar por telefone. Na Segurança Social não houve milagre. Ali não conta nem a máscara, nem a distância, nem desinfectar as mãos. Ali, não é bem segredo estatístico, mas deve ser algum, só pode. O mesmo governo que manda sair de casa, manda entrar nos cafés e restaurantes, entrar nas lojas, gastar dinheiro e fazer compras, não pode inviabilizar o acesso básico das pessoas aos serviços públicos. Pelo menos parece. Vejamos.

Quero ir às Finanças resolver um problema, não posso. Parece que as pessoas não podem atender a povo. Aceleram para passar coimas e dar conta do juízo do povo coitado, mas atender gente contribuinte é uma impossibilidade. Aquilo, está bem de ver, não é uma casa de pasto. Quer vir, não entra, nem batendo na porta, terá de marcar.

Mas será que no público está tudo inquinado, em estado de guerra, exércitos invisíveis barricados de pá na mão para bater na covid? E, nas ruas, nas empresas, nas lojas e comércio, restaurantes e cafés está tudo afiançadamente livre de pandemia?

E o cidadão dá um pulo à biblioteca municipal para dar uma vista de olhos no jornal. Opsssssss, não pode, a informação não está disponível, o espaço está interdito, o povo não pode entrar. Também por ali deve andar o pândego ameaçando a malta. Filho de uma c...

E a Câmara Municipal, as autarquias estão receptivas aos seus munícipes? Também não. Também estão encerradas.

Afinal o bendito milagre é privado. Só funciona cá fora, onde querem que o povo encha os espaços, polvilhe as ruas, gaste dinheiro e entre aqui e ali para comer, comprar coisas e beber uns copos e uns cafés.

Isto é,  as fotos, vídeos, televisões e jornais, que mostram os mais importantes do país incentivando uma abertura real da vida do povo, e asseguram um Portugal milagroso e milagreiro, para inglês ver, são as mesmas pessoas que garantem a administração pública e a generalidade dos espaços públicos vedados, inacessíveis, de quarentena, em estado de guerra.

De facto, vamos lá nós acreditar em milagres. No Brasil chamam a estas coisas, salvo erro, fake news. Não houve milagre, nada está normalizado, e vemos muito teatro, mas não nos lugares adequados nem por actores artistas. Aqui, são actores, e são artistas, mas são outros.

"Ai Portugal, Portugal, do que estás à espera..."

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