quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

PORQUE PLATÃO ERA UM REACIONÁRIO E ATACAVA A DEMOCRACIA?


 

Platão (427-347 a.C.) foi um filósofo grego da antiguidade, considerado um dos principais pensadores da história da filosofia. Era discípulo do filósofo Sócrates. Atenas atravessava um período de decadência, tinha decorrido a Guerra do Peloponeso, assistia-se a uma hecatombe do sistema democrático de governar.

Aristocrata, ele pertencia a uma das mais nobres famílias de Atenas, tendo recebido uma primorosa educação. Chegou a participar nos Jogos Olímpicos.

Platão deveria ter-se dedicado à vida pública e enveredar pela política.

Sócrates, de quem era o mais virtuoso e dedicado discípulo foi condenado à morte sob a acusação de “perverter a juventude”. Platão, revoltado, abandonou quaisquer ideias de exercício da política e passou a dedicar-se inteiramente à filosofia.

Regressou a Atenas, depois de um longo exílio de 12 anos - a amizade com Sócrates colocara-o numa perigosa fragilidade - com a idade de 40 anos, tendo então edificado a "Academia", onde se reuniam mestres e discípulos que aí estudavam as temáticas relacionadas com os problemas do mundo e do homem.






Como funcionava a democracia ateniense?


  • Os cidadãos governavam a Pólis. Todos os cidadãos participavam nas decisões que respeitavam à vida pública de Atenas
  • Os cidadãos atenienses reuniam-se na Ágora, em sessões de 9 em 9 dias
  • Atenas era provavelmente a maior cidade do mundo conhecido e a sua população estimava-se em cerca de 160.000 habitantes. Os cidadãos eram cerca de 15.000
  • Não eram cidadãos a grande maioria da população entre as quais as mulheres, os estrangeiros e os escravos
  • A frequência na Ágora por parte dos cidadãos não era obrigatória. Em reuniões importantes podiam participar à volta de 1.500 cidadãos, existindo relatos de reuniões onde o número de participantes rondariam as duas centenas
  • Todo o tema levado à Ágora era discutido e a decisão não havendo consenso era obtida pela parte que tivesse o maior número de aderentes
  • Temas privados levados à Ágora tornavam-se assuntos de ordem pública
  • A figura central da reunião na Ágora era o mediador que era eleito por sorteio e necessariamente ocupava esse cargo em poucas sessões, sendo substituído, pelo que a rotatividade era a norma, o que se entende dado o horror que tinham os atenienses a tudo que pudesse parecer-se com tirania, perpetuação do poder
  • O sorteio - ao contrário de eleições ou concursos públicos - garantia a participação em igualdade a todos os cidadãos. Qualquer um podia ser mediador. Não havia qualquer avaliação de mérito ou escolha
  • O tema mais discutido na Ágora foi a vida privada dos atores das tragédias e comédias
  • O segundo tema mais discutido na Ágora foi a composição da delegação ateniense para os Jogos Olímpicos
  • A votação para decidir o assunto em discussão na Ágora dependia das intervenções de todos os cidadãos que expusessem as suas opiniões mas, em bom rigor, dos cidadãos com maior capacidade de argumentar, e desse modo, persuadir os cidadãos presentes
  • Os cidadãos que dominavam os assuntos que eram levados ao espaço Ágora, eram os sofistas, cidadãos estudiosos da retórica e hábeis na capacidade de persuadir, de convencer os demais cidadãos
  • Os dois mais influentes sofistas de Atenas foram Górgias e Protágoras




Platão não escondia o seu descontentamento como o modo de poder se exercia em Atenas. Para ele, a tese que poderia ter o aplauso da maioria dos cidadãos poderia não ser, necessariamente, a melhor. E reforçava que a mesma seria mesmo ruim, porque a maioria era ela mesma de qualidade duvidosa. Para mais, Platão via no trabalho dos sofistas um tipo de sedução muitas vezes divorciada da razão, do interesse geral, do interesse da Pólis. E, em sentido contrário com o enriquecimento dos sofistas, que recolhiam importantes dividendos por defender interesses instalados de uns e outros, Atenas declinava.

Percebemos que a democracia dos gregos nada tem que ver com as modernas democracias. Não há sorteios. Nem todos os cidadãos podem tomar a palavra nas decisões que lhe dizem respeito ou à sua cidade, ou país. Há eleições e concursos públicos. Há maiorias para decidir, nas mãos de eleitos entre os cidadãos. São as democracias representativas. Como as da Grécia, parecem hoje, atravessar uma profunda crise. 

Este pequeno trabalho é reflexivo. Não tenho a veleidade de trazer para este meu blogue teses, teorias, discursos ou lições, mas se em algum ponto se criar uma dúvida, um pensar, uma reflexão, certamente foi obra que logrou encontrar razão para aqui estar. Deixo algumas questões:
 
  • As maiorias que hoje decidem nas modernas "Ágoras" terão, por via de regra, uma razão indiscutível e as suas decisões são tomadas, verdadeiramente, em defesa do interesse público?
  • Os deputados que representam o povo de uma nação, ou região ou cidade são eleitos tendo em conta as suas capacidades, ideias e princípios, ou são escolha por interesse de uns poucos, sem a exigência de quaisquer requisitos que não a fidelidade ao interesse e aos seus líderes?
  • Existirão ainda nos nossos dias gente, entre os políticos, como os sofistas que se impõem através de discursos persuasivos para a manutenção do poder e de satisfação de interesses pessoais, como o enriquecimento e a vaidade?
  • O interesse público ainda é uma missão para as classes políticas nas democracias atuais?
  • Porque as tiranias a que os gregos tinham horror crescem, hoje, paulatinamente, ameaçando os sistemas democráticos?
  • Os tiranos mostram-se mais aptos à governação, ou os eleitos democraticamente afiguram-se inaptos ao exercício do poder de modo a garantir uma vida digna aos cidadãos?



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